Internacional

Pela derrota da invasão russa à Ucrânia! Todo o apoio e solidariedade à resistência ucraniana!

As duas ideias contidas no título acima não são, por incrível que possa parecer, consensuais na esquerda, inclusive em Portugal. Vejamos o que se passa.

Há dois factos indiscutíveis nessa guerra: a Rússia invadiu militarmente a Ucrânia e o governo e o povo ucranianos estão a defender-se. Militarmente superiores, as Forças Armadas russas bombardeiam cidades e provocam um banho de sangue e uma situação de crise humanitária, com mais de mil mortos civis, inclusive crianças, e mais de 2 milhões de refugiados. Por outro lado, a resistência ucraniana – militar e civil – parece ter surpreendido o agressor, com a sua determinação e coragem em enfrentá-lo. 

Historicamente submetida ao império czarista, a Ucrânia conseguiu a sua autodeterminação sob o governo de Lenine após a revolução de 1917, mas foi reconduzida à situação de brutal opressão secular durante a ditadura estalinista. Assim, a Ucrânia é uma nação oprimida que se tornou independente em 1991, após a dissolução da União Soviética. De lá para cá, enfrenta crises económicas e sociais que a colocaram no quinto lugar do pior desempenho económico mundial entre 1990 e 2017. Com governos que oscilam entre fidelidades a Moscovo ou a Washington, tornou-se alvo da cobiça económica e militar do imperialismo norte-americano e da sua NATO, ao mesmo tempo que a antiga chefe, a Rússia, não desiste de tê-la como propriedade sua.

A posição do PCP

A 24 de fevereiro, já os tanques russos penetravam o território ucraniano, o Partido Comunista Português (PCP) recusava-se a condenar a agressão. O seu líder na Assembleia da República, João Oliveira, evitava a palavra “invasão” e afirmava que os Estados Unidos (EUA) eram os “verdadeiros interessados numa nova guerra na Europa”.

Em nota do seu gabinete de imprensa, no mesmo dia, o PCP responsabilizava os EUA, a NATO e a EU, devido à sua “estratégia de tensão e confrontação” contra a Rússia, com o alargamento da NATO e o seu reforço junto às fronteiras da Ucrânia. Mesmo admitindo ser a Rússia um país capitalista, argumentava de forma justificativa que o povo russo não consideraria aceitável o cerco militar da NATO. Em entrevista ao jornal Público, dias depois, João Oliveira afirmava-se contrário à ajuda militar à resistência ucraniana e acusava Volodymyr Zelensky de incorporar forças nazistas na Forças Armadas. O PCP diz-se contra a guerra e pela paz na Ucrânia, mas continua sem condenar a invasão da Rússia.

Posicionamentos semelhantes foram adotados por partidos, personalidades e imprensa da mesma órbita política (em especial, mas não só). O Partido Comunista Brasileiro (PCB), por exemplo, refere-se à invasão russa como o “conjunto de operações militares especiais” adotadas devido ao anunciado ingresso da Ucrânia na NATO, o que colocaria em risco a segurança da Rússia.

O aproveitamento da guerra

Uma outra posição frente à guerra prende-se ao seu aproveitamento para justificar o fortalecimento da NATO no mundo e na Europa em particular. 

Nesse cenário, devemos condenar o posicionamento adotado pelo governo português, liderado pelo Partido Socialista (PS) e pelo primeiro-ministro António Costa, de total submissão às diretrizes da União Europeia e da NATO (sufragado pela direita), a ponto de consentir no envio de cerca de 1500 soldados e equipamentos militares para atuarem sob o comando da NATO em operações em países com fronteira perto da Ucrânia. Além disso, aproveitando o conflito, já está na ordem do dia o reforço do financiamento da NATO, para o qual Portugal será forçado a contribuir, mais uma vez às custas dos Orçamentos do Estado, que já não garantem questões essenciais como Saúde, Educação e apoios sociais. 

Um outro exemplo recente foi também dado pelo Parlamento Europeu quando aprovou uma resolução que, além de condenar a agressão militar russa e exigir o seu fim, afirma que a “NATO constitui o baluarte da defesa coletiva para os Estados-Membros” e defende o seu reforço nos “estados-membros geograficamente mais próximos do agressor russo e do conflito”.

Os deputados do PCP no Parlamento Europeu votaram contra esta resolução, enquanto os do Bloco de Esquerda (BE) votaram a favor no seu conjunto, apesar de terem votado contra os pontos que defendem o alargamento da NATO, “uma organização que nunca serviu a paz e é historicamente responsável por inúmeras ocupações, conflitos armados e manobras de desestabilização”, conforme justificativa de sua declaração de voto. 

A nossa posição

Em primeiro lugar, mesmo concordando que os EUA, a NATO e a União Europeia pretendem consolidar a Ucrânia como área de influência sua, não só do ponto de vista económico, como também militar, acreditamos que isso não justifica qualquer agressão da Rússia a esse país. A Ucrânia é um país independente e assim deve ser tratado. Os conflitos existentes no seu território, como na região do Donbass, fruto de um passado em que o seu direito à autodeterminação não foi respeitado, devem ser resolvidos pelos próprios ucranianos, e não por potências, sejam elas a Rússia ou as integrantes da NATO, cujo único propósito é subjugar a Ucrânia para dela retirar vantagens. 

A Rússia é um país capitalista que constitui uma potência regional e possui um dos maiores arsenais nucleares do planeta, sendo governado por um ditador que não hesita em matar e torturar os seus oponentes e esmagar os países que lutam para livrar-se de suas garras, como foi o caso da Tchetchénia, nos anos 1990. O seu desmoronamento económico e social provocado pela restauração capitalista, a partir da Perestroika de 1986, foi aproveitado pela burocracia do partido comunista para se transformar em burguesia. É com o apoio desses bilionários, chamados de oligarcas, que Putin quer recuperar o seu antigo poder e assegurar a sua área de influência na região. Para isso, não hesita em bombardear os seus vizinhos mais relutantes, como a Ucrânia.

Os EUA, a NATO e a União Europeia querem aparecer agora como os salvadores da Ucrânia, mas na verdade a sua única intenção é dominar política e economicamente esse país. Em nome da democracia, a NATO bombardeou a Sérvia e a Líbia, os EUA invadiram o Iraque e o Afeganistão, sempre com o apoio de seus aliados europeus, e continuam a intervir na política interna de muitos países. De acordo com a Universidade de Brown, desde o 11 de setembro as intervenções militares da NATO, com o apoio dos aliados europeus, provocaram 38 milhões de refugiados e 900 mil mortos. Há ainda um elemento essencial: a interferência militar de qualquer país da NATO na Ucrânia poderia ter como consequência o desencadear de uma nova guerra mundial.

Devemos, sim, apoiar a resistência ucraniana e o envio de armas e alimentos para que possam enfrentar o exército russo e derrotá-lo. Apenas a luta do povo ucraniano e a solidariedade mundial dos povos e trabalhadores, e não qualquer intervenção da NATO e da UE, podem garantir a unidade e independência da Ucrânia! Essa é a única saída para uma Ucrânia soberana. Esse apoio não significa qualquer confiança no governo burguês e pró-imperialista de Zelensky, mas total confiança no povo ucraniano e no seu direito a defender-se do agressor e assegurar a integridade territorial e a independência do seu país. 

Não apoiar a resistência com a desculpa de que há grupos nazistas no governo de Zelensky (e que também existem no governo Russo), ou defender a paz no abstrato é, na prática, dar cobertura ao governo de Putin quando bombardeia cidades inteiras e mata milhares de pessoas. Esta não é uma guerra entre países imperialistas, quando a posição correta seria não apoiar nenhum dos lados. É uma guerra desigual, iniciada pela invasão de um país oprimido pelos tanques e a aviação de uma potência militar que historicamente o subjugou. Há dúvidas de que lado devemos estar? 

Finalmente, exigimos que o governo português e restantes governos europeus tomem todas as medidas para receber os e as refugiadas sem restrições, ao mesmo tempo que recusamos qualquer envio de tropas portuguesas para forças da NATO no âmbito do conflito ou qualquer reforço do financiamento desta às custas do dinheiro dos nossos impostos!