Escudando-se num “apelo ao diálogo e à paz”, à “negociação”, no suposto “golpe de estado de 2014” ou à denúncia (que consideramos correta…) dos planos belicistas dos EUA, da NATO e da UE, escondem o facto incontornável de ser o exército russo que em território ucraniano está a destruir selvaticamente cidades ucranianas e milhares de vidas do seu povo e classe trabalhadora. Sim, pode haver diálogo e paz, mas com as tropas invasoras fora de portas! Estivesse o exército imperialista da NATO e da UE a invadir território ucraniano ou qualquer cidade russa e estaríamos na rua – como já estivemos na invasão do Iraque -, ao lado do PCP e de todas as organizações e movimentos, para exigir a sua retirada incondicional e o seu direito a armar-se para se livrar das garras imperialistas!… Mas para a direção do PCP, o direito de cada povo ou república à autodeterminação não é inalienável, mas um favor ou concessão da potência russa. Tristemente, esta conceção já tem uma longa tradição na direção e história do PCP: vejam-se os seus apoios ou silêncios perante as invasões e repressão russas da Checoslováquia (1968), Polónia (1939 e 1980), Afeganistão (1979), Tchetchénia (1994 e 1999), Geórgia (2008), Síria (2015), Cazaquistão (dezembro 2021),…
Mudar algo para que fique igual…
É verdade que alguns dirigentes do PCP começaram a introduzir algumas ‘variações’ às posições iniciais emitidas logo após a invasão: João Ferreira, por exemplo, começou a incluir nas suas declarações o reconhecimento de uma ‘invasão’. Mas isso foi uma adaptação face ao seu isolamento e ao clamor e mobilização anti invasão popular e internacional e, por fim, também mais uma conquista da resistência popular ucraniana que ao travar a pretendida vitória rápida do exército russo tornou incontornável a evidência quotidiana da guerra de agressão em solo ucraniano aos olhos de todo o mundo. Em tudo o mais as posições do PCP cobriram a propaganda e mentiras da oligarquia russa. Sobre a exigência de retirada imediata do exército invasor ou solidariedade para com o povo ucraniano agredido e à sua resistência, o silêncio é total.
Oligarquia russa é anti-imperialista?!
Não dizemos que a direção do PCP se identifica com Putin e a sua oligarquia e interesses, ou com o seu sistema capitalista. Dizemos, sim, que o PCP justifica a criminosa invasão russa por entender o capitalismo russo e os seus oligarcas – repetimos, gerados tal como Putin nos privilégios da anterior burocracia estalinista… – como um “capitalismo anti-imperialista” e, por isso, na disputa com os EUA, NATO e UE, concede-lhes o direito de impor a guerra de invasão aos povos ucraniano, tchetcheno, georgiano, cazaque. Nas palavras de Sergei Lavrov, ministro dos negócios estrangeiros russo, aquele “anti-imperialismo” geraria “um futuro mais justo, porque multipolar”.
Acaba por dar uma boa ajuda ao domínio de Putin e da sua oligarquia sobre o povo e trabalhadores russos ao não impulsionar a resistência ucraniana que, a triunfar, significaria uma crise profunda para o despotismo da classe dominante russa. Tal como na Revolução Portuguesa: a luta política e militar das massas oprimidas negras das ex-colónias portuguesas ao desagregar e derrotar o exército colonial-fascista abriu as portas por onde irromperam impetuosamente as lutas da classe trabalhadora portuguesa.
Pela vitória do povo ucraniano!
Novamente rendidos ao mal menor, os dirigentes do PCP desprezam a terceira alternativa que tem sido a luta corajosa e sacrificada que o povo e trabalhadores ucranianos têm travado e que tem alterado o plano agressor. Entretanto, é um facto que por cada dia de invasão pelas tropas russas, o povo ucraniano é empurrado para os braços da NATO, da UE, e de Zellensky. Mas se a resistência ucraniana derrota a invasão e ganha uma Ucrânia livre e unificada de Kiev até à Crimeia, é não só um exemplo para os povos de todo o mundo, em particular para os povos que vivem subjugados pelo regime de Putin, como ainda uma derrota para Putin e restante oligarquia, mas também uma derrota para a NATO e a EU, que terão que conviver com um povo vitorioso e confiante nas suas forças. A esquerda, a classe trabalhadora de todo o mundo, tem que fazer todo o possível para merecer o respeito e confiança daquele povo.
Embora consideremos que no contexto desta invasão a alternativa é simples – apoiar a resistência ucraniana ou conciliar com a invasão -, temos consciência de que há um debate complexo a efetuar na esquerda que apenas iniciámos neste artigo. As forças do Em Luta, da nossa organização internacional, a Liga Internacional dos Trabalhadores (IV Internacional), ao mesmo tempo que se mostra disponível para participar em todos os debates, chama todos os trabalhadores e organizações a manifestar solidariedade com a resistência ucraniana e a exigir armas para o povo ucraniano!