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50 anos de Abril: em luta por uma nova revolução

A 25 de Abril de 1974 começava a revolução em Portugal. O que era para ser um golpe de Estado, virou uma forte revolução com o povo na rua a impor mudanças estruturais no país. Passados 50 anos, vivemos uma forte crise política e social, com a ameaça do retorno das forças reacionárias do passado. O que se passou no país que nos trouxe a este desfecho?

Uma luta por liberdades democráticas, mas também pelo socialismo

O desgaste da longa guerra colonial levou a uma forte crise nas forças armadas, que conformaram o MFA (Movimento das Forças Armadas). Na noite do dia 25 o povo não acatou as ordens do MFA e saiu às ruas dando início à revolução.

De início, as principais reivindicações eram democráticas, pelo fim da ditadura, pela convocatória de uma Assembleia Constituinte e saneamento das forças repressivas do Estado. Mas a revolução avançou rapidamente contra as grandes famílias burguesas portuguesas, como os Mello, Champalimaud e Espírito Santo, profundamente associadas ao regime fascista.

Por isso, na grandiosa manifestação do 1º de Maio de 1974, não apenas as reivindicações democráticas e contra a guerra colonial estavam em destaque, mas também as reivindicações operárias por aumentos de salários e melhores condições de vida. Desencadeando uma grande onda de greves em resposta à exploração sofrida por tantos anos.

Na vanguarda da revolução estavam os operários, os assalariados agrícolas e a juventude, que formaram os seus próprios órgãos: as comissões de trabalhadores, de moradores, camponeses e soldados. As comissões não só dirigiam a luta, mas também resolviam questões cotidianas, como construção de casas, gestão de empresas, abertura de escolas, creches, consultórios médicos e ocupações de terras.

A revolução questionava a ditadura, mas também o sistema capitalista como um todo. Estava em marcha uma revolução socialista, que colocaria em xeque todo o poder da burguesia.

A derrota da revolução socialista, a constituição da democracia dos ricos 

Nos 18 meses em que durou a revolução, os consecutivos governos provisórios (compostos quase sempre pelo MFA, PS, PCP e PPD/PSD) tentavam conter a força do poder que nascia das ruas. Daí vieram a Lei da Greve e da requisição civil, que servem até hoje para reprimir o movimento operário.

O PS defendia uma democracia burguesa, à semelhança da Europa Ocidental. O PCP estava condicionado pela política da URSS de aceitação da divisão do mundo em dois, não pretendia lutar pelo socialismo em Portugal, mas sim disputar espaço no aparelho de Estado que lhe permitisse controlar o movimento operário e conseguir que o país não estivesse diretamente alinhado com o Bloco Capitalista dos EUA e Europa. Com projetos diferentes, PS, PCP e MFA tinham um grande acordo: aceitar a manutenção do capitalismo em Portugal e derrotar a auto-organização dos trabalhadores que questionava o seu poder.

O 25 de novembro, que a direita faz questão de comemorar, tinha como objetivo derrotar a revolução e o duplo poder. A burguesia aproveitou uma provocação do setor militar “esquerdista” para acabar com o duplo poder dentro das Forças Armadas, que era um dos elementos mais radicais da revolução. O PCP chama os seus militantes a não resistirem ao golpe (ao contrário do que acontecera no 11 de março). Por trás há um grande pacto entre o PS e PCP: a aceitação do projeto de democracia burguesa em Portugal, na qual o PCP terá o papel determinante de controlar o movimento operário, até hoje tão visível nas caraterísticas do movimento sindical português. Assim abre-se espaço para a aprovação da constituição em 1976 e para a realização das primeiras eleições legislativas.

O desmonte das conquistas da revolução

A constituição de 1976 vai consagrar várias vitórias do movimento de massas durante o período revolucionário. São exemplo disso: o direito à saúde e o ensino universal, público e gratuito; a manutenção das nacionalizações realizadas no período revolucionário, como a banca e outros setores estratégicos; o direito à greve;  a legalização das Comissões de Trabalhadores e Moradores; as liberdades políticas, muito mais amplas, se comparamos com outros países.

Contudo, a constituição, apesar do seu palavreado revolucionário, tem um caráter essencialmente capitalista e são as relações de produção que esta defende, assentes na exploração e na propriedade privada dos meios de produção, que vão trazer-nos até à situação de crise atual.

Em oposição a um estado operário e socialista, o projeto do PS da “Europa connosco” vai ser aplicado, levando à aplicação das medidas neoliberais (privatizações e retiradas de direitos) durante os anos seguintes. A crise de 2008 e as medidas da Troika vão ser a machadada final deste processo, aprofundando a dependência económica de Portugal e submetendo o país ainda mais aos desmandos da UE.

Não foram só as conquitas económicas que retrocederam. É sintomático que, 50 anos depois da revolução, haja 50 deputados no parlamento cujo líder defende o slogan de Salazar e é financiado pelas famílias que foram cúmplices do Estado Novo. Porém não é só o Chega que fortalece as forças reacionários do passado. Também o Presidente da República condecorou Spínola, representante do projeto reacionário derrotado pela revolução. O regime mostra que anda de mãos dadas com as forças reacionárias, não por acaso, Portugal ainda mantém a sua visão idílica do colonialismo, perpetuando o racismo cotidianamente.

Em luta por uma nova revolução

Em sondagem feita pelo Expresso/SIC, 47% dos portugueses dizem achar que Portugal precisa de um líder forte, mesmo sem eleições, e 20% afirmam que o Estado Novo tinha mais coisas positivas do que negativas. Mas há ainda uma ampla maioria (65%) de pessoas que atribuem ao 25 de Abril a data mais importante da história de Portugal, atribuindo à revolução conquistas como saúde, educação, nível de vida, segurança social, entre outras. Fruto dos retrocessos das últimas décadas, estamos num momento político determinante, em que é preciso afirmar uma saída revolucionária para os problemas atuais, para resolver a crise social e conter o avanço da extrema-direita.

O novo governo da AD (PSD/CDS) já mostrou bem ao que veio. Pretende liberalizar ainda mais a economia, favorecendo os ricos e flertando com a extrema-direita. Pretende comemorar o 25 de novembro, como parte de uma batalha ideológica para “normalizar” as ideias reacionárias e a derrota da revolução. Isto coloca a necessidade de que as direções sindicais e partidárias das organizações da classe trabalhadora construam desde já a mobilização para enfrentar os ataques que virão deste Governo.

Contudo, as lições do 25 de abril mostram que não será possível combater o Governo da AD e a extrema-direita, de mãos dadas com o PS e focando exclusivamente na disputa dentro do parlamento. A aliança do BE e PCP para sustentar o governo da Geringonça, acabou por dar mais força ao PS e por não responder aos retrocessos estruturais que vive o país. Por isso, a esquerda parlamentar, BE e PCP, deve resistir à AD e ao Chega no parlamento, mas se pretendem uma alternativa política ao Chega, não podem insistir em ter como saída uma nova Geringonça. É preciso organizar a mobilização nas ruas, bairros e locais de trabalho e construir uma alternativa da classe trabalhadora.

É necessário apresentar um programa radical que combata o governo, incluindo a extrema-direita, responsabilizando claramente os culpados pela situação atual. Se, 50 anos depois da revolução chegamos até aqui, é pelo projeto capitalista do PS, pelos sucessivos governos neoliberais do PS e PSD e pelo apoio cúmplice do PCP e, posteriormente, do BE.

Deve-se defender os serviços públicos, o controlo dos preços, a diminuição das rendas, a renacionalização da banca e das empresas estratégicas sob controle dos trabalhadores, assim como emprego digno com direitos. Isso implica um novo projeto de país ao serviço da classe trabalhadora e dos setores mais oprimidos, rompendo com a submissão aos grandes países imperialistas. É preciso sair do Euro e da UE para acabar com as regras de austeridade, déficit e dívida, e retomar o controlo sobre a emissão de moeda e a economia. Significa também sanar as contas com o passado colonial, defender um programa que una a classe trabalhadora contra o racismo, a xenofobia, a misoginia e a LGBTIfobia. É necessário confiar na força e na organização da classe trabalhadora, só um verdadeiro governo dos trabalhadores pode pôr fim à crise social atual.

Assim, nos 50 anos de Abril, é crucial lutar por uma nova revolução. É urgente construir uma alternativa da classe trabalhadora e do povo pobre, com um programa de independência de classe contra a exploração e opressão, por uma sociedade verdadeiramente sustentável, ambiental e socialmente. Nós do Em Luta estamos comprometidos com a construção desse projeto. Junta-te a nós!