Internacional

EUA: Derrotar Trump e a extrema-direita nazi

O protesto de neonazis na cidade de Charlottesville, no estado norte-americano da Virgínia, no último dia 12 de agosto, mostrou uma extrema-direita que começa a colocar a cabeça de fora e mostrou também  a necessidade do enfrentamento com as manifestações desses setores supremacistas.

O primeiro protesto da jornada reacionária intitulada “unite the right” (unir a direita) ocorreu de surpresa na sexta-feira, dia 11, para evitar uma contraofensiva, e foi uma tentativa de reeditar as marchas da famigerada organização racista Ku Klux Klan, com as simbólicas tochas acesas que eram utilizadas para aterrorizar e incendiar negros e as suas casas. Reunia várias organizações de extrema-direita, muitas delas declaradamente nazis, e vários grupos fortemente armados com espingardas e pistolas.

O mote para a marcha foi um protesto contra a retirada da estátua do general sulista Robert E. Lee do parque municipal de Charlottesville. Lee lutou pelo Sul esclavagista durante a Guerra Civil (1861-1865) e é hoje, juntamente com a bandeira confederada, uma referência para os racistas e neonazis norte-americanos.

Aos gritos de “vocês não nos vão substituir”, “as vidas brancas importam”, “morte aos antifas” e “Heil Trump”, a marcha demonstrou o seu caráter racista, anti-imigrante, antissemita e LGBTfóbico. Estudantes da universidade da Virgínia tentaram fazer frente à marcha, mas não conseguiram desarticulá-la.

No sábado, dia 12, porém, quando o protesto principal estava marcado, ativistas de organizações de esquerda e antirracistas como o Black Lives Matter conseguiram organizar-se para se contraporem à manifestação neonazi. Durante os confrontos, um ativista da extrema-direita avançou com o seu carro contra os manifestantes e matou a militante pelos direitos civis Heather Hayer, de 32 anos, deixando ainda mais de 30 feridos.

Apesar disso, havia muitos mais contramanifestantes antifascistas do que neonazis. Poucas horas depois da marcha racista e do assassinato, ocorreram dezenas de eventos em diversas regiões dos EUA. Na própria noite de sábado, dezenas saíram às ruas no estado da Califórnia contra a mobilização da extrema-direita na Virgínia. Ocorreram manifestações em cidades como Oakland, San Francisco, San Diego e Los Angeles.

O presidente norte-americano, Donald Trump, após ter permanecido em silêncio durante horas, divulgou um comunicado no qual condenou a “flagrante manifestação de ódio, intolerância e violência de muitos lados“, sem citar a extrema-direita para não se desgastar junto dos setores que o apoiaram abertamente durante as eleições e que continuam a apoiá-lo. Porém, a pressão foi tão grande que, nesta segunda-feira, dia 14, Trump foi obrigado a condenar diretamente os supremacistas e o racismo, numa rápida declaração à imprensa.

O estrago, porém, já estava feito. Uma sondagem realizada entre sexta-feira e domingo mostra que a popularidade de Trump caiu para 34%, índice extremamente baixo para um presidente em início de mandato.

Polarização social

 
O protesto da extrema-direita norte-americana e a forte reação que despoletou são resultado da enorme polarização decorrente da crise económica, social e política no coração do imperialismo.

A crise económica mundial – que teve os EUA como epicentro – foi enfrentada internamente pela administração Obama com uma política cujos efeitos recaíram sobre os ombros dos trabalhadores, com demissões, desemprego e aumento da pobreza e da miséria. Para os bancos e grandes empresas, foram biliões em ajuda como nunca antes se viu na história do país. Externamente, os EUA aprofundaram a rapina e a exploração dos trabalhadores dos países coloniais e semicoloniais, como o Brasil.

Facto é que, com um rosto humanitário, o Governo Obama salvou os grandes capitalistas à custa dos trabalhadores e da grande maioria da população. Nisso, os setores oprimidos como os negros foram os mais prejudicados. A violência racista durante o seu Governo, não só não diminuiu como explodiu em casos como o de Ferguson, no Missouri, em que o assassinato do adolescente negro Michael Brown pela Polícia despoletou uma onda de protestos por todo o país.

A improvável eleição de Trump dá-se sob essa crise, que pôs em cheque o bipartidarismo ao eleger o populista de extrema-direita à revelia da própria direção do Partido Republicano. Tanto o Partido Republicano como o Democrata, os tradicionais partidos da burguesia norte-americana, enfrentam um profundo descrédito popular, o que abriu caminho a Trump e à sua retórica reacionária. É o regresso da “cara feia” do imperialismo.

O que muitas organizações de esquerda viram como um avassalador avanço da extrema-direita e do fascismo é, no entanto, expressão dessa crise e da polarização que ocorre em tempos de profunda instabilidade. Prova disso é que, antes mesmo de tomar posse, Trump já enfrentava manifestações de massas comparáveis apenas aos protestos contra a guerra no Iraque.

O setor da extrema-direita que apoiou Trump sente-se agora mais à vontade para colocar a cabeça de fora e tentar canalizar o desgaste dos políticos tradicionais e do establishment. No entanto, a resposta massiva que tem vindo a receber e o profundo desgaste do Governo Trump mostram que a crise avança no centro do imperialismo e que a classe trabalhadora e a maioria da população, longe de refletirem uma onda reacionária, estão contra Trump e os fascistas.

Enfrentar a extrema-direita

É urgente uma saída da classe operária e do povo pobre contra a crise e os ataques do Governo Trump contra os trabalhadores, os negros, os imigrantes, as mulheres e os LGBT’s, e também contra os grupos fascistas e de extrema-direita. Os setores da extrema-direita devem ser enfrentados com ação direta e autodefesa pelos trabalhadores e as suas organizações. O facto de não haver uma onda reacionária no país não exime as organizações de esquerda de lutarem pelos direitos civis e democráticos, de derrotarem e esmagarem qualquer evento, protesto ou tentativa de organização dos neonazis. Para isso, não podem contar com a hipócrita justiça norte-americana e a sua Polícia que mata negros, mas com as suas próprias forças.

O assassinato de Heather Hayer coloca na ordem do dia a necessidade da autodefesa armada frente a esses grupos.

Texto originalmente publicado aqui.