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POR UMA TAP E AVIAÇÃO 100% PÚBLICAS

A aviação é um dos sectores onde a pandemia do covid-19 está a ter mais impacto. Em todo o mundo dezenas de milhares de trabalhadores ligados ao sector estão em lay-off, com licenças sem qualquer remuneração ou foram já despedidos.

Falamos de prejuízos e faltas de liquidez na ordem dos milhares de milhões. Diminuições abruptas de passageiros e de frota programadas na ordem dos dois dígitos percentuais. Se a aviação antes da pandemia já refletia a crise que se estava a instalar e apresentava falências e despedimentos em companhias mais periféricas, daqui para a frente o cenário não será melhor.

A companhia aérea TAP não foge a esta situação mundial e nas últimas semanas tem sido tema de debate na opinião pública, na imprensa e no Parlamento. No mês de Maio foram apresentados dois projetos de lei pelo PCP e BE com vista à nacionalização da companhia, inclusivamente da empresa de handling (assistência em terra) Groundforce, da qual a TAP detém 49,9%.

A União Europeia é um garrote

O debate em torno da crise das companhias aéreas está dependente de decisões da União Europeia. O governo irá decidir o futuro da TAP consoante as medidas e decisões da Europa, decisão que privilegiará a ponte com os privados e, portanto, continuará o ataque aos trabalhadores já iniciado com a austeridade do lay-off; além disso, a posição da TAP privilegiará companhias de países poderosos dentro da UE, como a Lufthansa (Alemanha) ou a Air France (França) pela sua grandeza e predominância no mercado. Assim, é fundamental compreender este projeto de Europa e a nossa posição de submissão face ao mesmo, para exigirmos que a decisão tomada sobre a TAP seja feita no interesse dos trabalhadores e garantindo os seus postos de trabalho e salários, e não no interesse dos mais fortes.

As negociações estão também a ser feitas com os acionistas privados da companhia, tendo sido construído um “grupo de trabalho” para o efeito, onde está presente o escritório de advogados Vieira de Almeida (pelo Estado) e a Deloitte, tudo boa companhia. Mas porque não são os trabalhadores tidos e achados nesta decisão? Porque os ministros, gabinetes de advogados e consultoras que estão a decidir um caminho para a TAP, não o fazem no interesse “nacional”, do transporte aéreo e dos trabalhadores, mas sim no interesse dos privados e da União Europeia. Os trabalhadores e as suas organizações devem ser tidos e achados sobre as decisões e o futuro da Companhia, que os afetarão diretamente.

Projetos de Lei necessários, mas insuficientes

O Bloco de Esquerda e o Partido Comunista Português apresentaram, durante o mês de maio, dois projetos de lei para a nacionalização da TAP e da SPdH/Groundforce. Temos acordo com a sua proposta de nacionalizar, mas temos uma posição crítica no que toca às suas propostas relacionadas com as indemnizações e a dívida.

A dívida da TAP foi uma pedra de arremesso atirada pelos paladinos da privatização no processo de 2014/15. Defendiam que uma gestão privada seria melhor e resolveria a situação, colocando “naturalmente” a companhia na concorrência livre, honesta e justa do mercado. Hoje passados 5 anos podemos fazer um balanço desta gestão e constatar que a dívida aumentou. Esta dívida está calculada em 1000 milhões, mais 2300 milhões em leasings de aeronaves; o sobredimensionamento da companhia que foi feito pela gestão privada, aumentando o número de destinos e de aeronaves na frota da companhia, já estava a causar prejuízos antes do COVID e agora empurra todas as semanas a TAP para números mais negativos.

Para resolver a dívida é necessário ter a noção do que foi gasto e onde foi, é necessário então conhecer a parte da dívida que é real e a partir daí agir sobre ela no sentido do interesse dos trabalhadores. É fundamental então fazer uma auditoria às contas e separar o trigo do joio, ou seja, toda a especulação financeira, prémios, comissões, contratos danosos, etc, não devem ser da responsabilidade do estado e dos contribuintes ficando esta de uma vez por todas para os privados.

Os dois projetos de lei contemplam indemnizações, com as quais não concordamos. Primeiro é preciso ter noção que tanto Neelman na TAP, como a Urbanos (Gepasa) na Groundforce, fizeram compras em saldo (10 milhões pela TAP) e de graça na Groundforce. Pensar em indemnizações é ainda mais imoral quando estes senhores nem com as dívidas das empresas ficaram na altura, passando em ambos os casos a responsabilidade para o Estado. Presentear os privados com indemnizações, ainda para mais num momento de crise, não pode estar no orçamento de estado.

Nacionalizar para garantir os empregos

A TAP à semelhança do que está a acontecer com outras companhias sofrerá um processo de reestruturação pela crise, mas também pela má gestão privada ao sobredimensionar a companhia. Deste processo é preciso então garantir que não resultem mais despedimentos, como está a acontecer noutros países. Daí é fundamental garantir os postos de trabalho aplicando medidas como a redução do horário de trabalho para as 35 horas semanais sem redução de salário, de forma a distribuir o trabalho existente por todos, e aplicar reformas antecipadas para os 55 anos, uma situação necessária e justa para um sector de trabalho por turnos e de desgaste rápido.

Nacionalizar o Grupo TAP com o controlo democrático dos trabalhadores é a saída para garantir os postos de trabalho. Qualquer saída intermédia onde o Estado mais uma vez gastará milhões em benefício dos privados é uma saída mais cara para o orçamento de estado e sobretudo para os trabalhadores e suas famílias.

Carlos Ordaz