A NOSSA CLASSE Nacional

OE 2024: um serviço ao capital, ao BCE e a Bruxelas

A nosso ver, o OE para 2024 - embrulhado agora na crise política aberta nas “alturas” provocada pela demissão de António Costa - é um reflexo – mais um… - da decadência social e económica do país e da subserviência da burguesia e elites governantes perante os ditames do capital internacional e suas organizações como o BCE e a UE.

O  Presidente Marcelo, do alto do escadote de bonaparte que herdou dos poderes constitucionais impostos a partir do golpe militar de 25 de novembro de 1975, anunciou em “horário nobre” que o Governo da maioria absoluta do PS, acompanhado do seu próprio OE, irá continuar a governar; a principal razão é a suposta necessidade de aprovação, com o OE, das medidas inerentes à execução das “ajudas” inseridas no PRR (Plano de Recuperação e Resiliência), uma das fontes de corrupção, compadrio e subserviência dos últimos tempos.

Um OE ao serviço da classe dominante

O Orçamento de Estado é pois uma peça decisiva para a manutenção do país no torniquete de Bruxelas e da UE, para a asfixia dos serviços públicos, direitos sociais e salários para toda a classe trabalhadora portuguesa por via da continuação da imposição direta da desvalorização salarial para os 800 mil trabalhadores da Administração Pública. É esta asfixia que faz Portugal atrair os fundos e capitais estrangeiros – e também nacionais – fixando o país como plataforma para a multiplicação dos seus lucros, que depois regressam aos grandes circuitos imperialistas.

O investimento alemão da VW-Autoeuropa, tão citado por Costa e toda a burguesia, ilustra exemplarmente o seu paradigma e projeto para o país: os governos garantem em Portugal a mão-de-obra com salários e condições de trabalho de baixo nível europeu e até “apoios financeiros e disponibilização de infraestruturas”; as multinacionais recuperam o valor multiplicado dos seus investimentos com a venda da mercadoria produzida pelos operários portugueses nos mercados internacionais. É aquele paradigma e projeto,  “regado” ou não pelos fundos europeus, que não têm tirado o país, os trabalhadores e os serviços públicos da crise e da “cauda da Europa”.

De acordo com o estudo baseado no Eurostat do economista da CGTP, Eugénio Rosa,  enquanto a produtividade média da economia portuguesa entre 2012 e 2022 variou entre 77 e 75% da média da UE, o salário médio português manteve-se entre 59 e 57% do salário médio da UE; ou seja, o salário do trabalhador português não acompanha o ritmo da criação de riqueza, o que tem feito aumentar a sua exploração. Entretanto, as próprias previsões do OE2024 para 2023 e 2024 são de 2,3 e de 1,5% respetivamente, não fugindo à amarração à crise capitalista e decadência também vigentes na UE.

As contas certas do OE de Costa e Medina

A par da mentira de António Costa de que é o investimento estrangeiro e nacional que irão melhorar as condições de vida do povo português, pelo que o seu “grande orgulho tem sido o de agilizar esse investimento” (SIC, declaração de 11nov.), o governo PS procura ainda apresentar o OE para 2024 como o “OE das contas certas”. Com esta propaganda, apontada ao senso comum, pretende convencer-nos que, “perante a fragilidade e a falta de recursos do país (…) as despesas do orçamento não podem ultrapassar os recursos e impostos recolhidos” ou que “os serviços públicos e salários dificilmente podem melhorar, pois isso implicaria mais impostos, mais défice e… mais crise!”

As cativações do Orçamento do Estado

Contudo, como refere o economista Ricardo Paes Mamede, no Público de 23 de outubro, desde 2015 – com governos PS-Geringonça e PS – que o que é escrito nos OEs não bate certo com o que é executado: nos últimos dois anos, fruto do aumento drástico do roubo nos impostos (IVA…), por via da subida dos preços nos bens essenciais e menos despesas sociais, o saldo real tem sido sempre superior ao previsto (este ano em cerca de 2 mil milhões) que é então canalisado no essencial para o pagamento da dívida pública… Recordemos que quem alcançou este “êxito” pela primeira vez foi Mário Centeno, em 2019. Finalmente, o investimento público real, devido ao controlo férreo governamental na sua execução no dia a dia, tem ficado cerca de 25% abaixo do votado no “espetáculo orçamental” no Parlamento (mesmo contando com as “ajudas” do PRR). Eugénio Rosa referia ainda no seu estudo de 9 de setembro último:  “Nos últimos 12 anos, a média do investimento público na U.E. foi de 3,1% do PIB, enquanto em Portugal apenas 2,2% do PIB (-27,4%). (…). Em 2023, dos 753,4 milhões € de investimento previsto no SNS até julho só tinham sido executados 123,4 milhões € , ou seja, apenas 14,3%.”

O roubo dos juros da dívida que enchem os bolsos dos banqueiros

Outro “aspirador” da riqueza produzida pela classe trabalhadora portuguesa e que desvia o investimento dos serviços públicos de qualidade é o chamado “serviço dos juros da dívida pública”, previsto para 2024 no valor de 6270 milhões de euros (2,3% do PIB), dívida cujo total alcançava, no final de 2022, 270 mil milhões de euros (87% da qual é detida pelo conjunto de estrangeiros, seguradoras e fundos financeiros, bancos, BCE, etc…).

Mas outra mentira de Costa-Medina é que este orçamento vai orientar o país para o desenvolvimento.  Cada vez menos a riqueza produzida pela classe trabalhadora portuguesa é reinvestida no desenvolvimento do país, mas sim na acumulação improdutiva daquela riqueza no capital das grandes empresas e dos bancos que escapam às “contas certas” do OE, o que constitui uma desavergonhada e reconhecida “fuga” aos impostos. À sombra das elevadas taxas para o crédito decididas pelo BCE, nomeadamente para habitação, os bancos têm obtido elevados e vergonhosos lucros: nos primeiros 3 meses deste ano, e segundo a RTP, só a CGD, o BCP, o Santander, obtiveram, respetivamente, 285, 215 e 186 milhões de euros de lucros; outras empresas obtiveram lucros igualmente vergonhosos, das quais referimos apenas algumas: a A GALP, entre janeiro e outubro deste ano, somou 718 milhões depois de em 2022 ter alcançado 880 milhões; O Grupo Luz Saúde encerrou o ano de 2022 com quase 600 milhões…

Todos juntos contra o OE de Costa-Medina!

A dupla Costa-Medina tem preparada no OE a política de ceder alguns tostões. O seu objetivo é tentar desmobilizar o movimento reivindicativo e a sua crítica e esconder a sua cumplicidade para com os milhões que na “economia privada” correm impunemente para as contas bancárias do patronato e finança. É assim que, por exemplo, está prevista a redução da taxa do IRS nos cinco primeiros escalões (assim como dos próprios escalões, inclusive dos mais elevados) e a isenção de IRS para salários até 820€; o aumento médio de 6,2% das pensões até 1020€ (que em rigor é resultado da lei já existente), mas que em quase nada altera o valor miserável da maioria das pensões; o aumento de várias pensões sociais; aumentos salariais na FP de 3 a 7%; a cedência de mais verbas para a construção pública de habitação (a par da recusa em apoiar as rendas ou travar o roubo dos bancos por via dos juros exorbitantes!…); etc…

Há vários anos que tem sido regra o congelamento dos salários e carreiras esmagadas por altas taxas de inflação e a degradação dos serviços públicos como no SNS, escolas e educação em geral… Estas medidas  não alteram a pobreza e a crise social em que vive o povo português, que é diariamente roubado e vê depois serem-lhe devolvidas esmolas, ficando os milhões para a clique dominante.

Trabalhadores da AP e do privado, juntos temos de estar em luta contra o OE de Costa-Medina, mais um OE da miséria, da degradação salarial e dos serviços públicos!

Edu Dário