Nacional

Novas eleições, o mesmo país

Cerca de um ano depois, vamos a novas eleições. Mas as novidades são poucas, quando existe um grande acordo, entre a ampla maioria dos partidos, num projeto de país de turismo, serviços e baixos salários, e quando a esquerda parlamentar se limita a propor uma versão leve deste projeto, sem questionar a origem dos problemas que atravessam o país, nem propor uma alternativa de conjunto.

Portugal: mais um quintal do imperialismo

Durante a crise de 2007/8, que levou a uma ingerência dos imperialismos europeus e norte-americano em Portugal, através da mal-afamada Troika, os trabalhadores e o povo pobre no país foram atingidos por uma onda de perda de direitos muito significativa, da qual ainda não recuperámos, passados mais de 10 anos da referida Troika ter “deixado” o país. As aspas não são de todo um acaso, uma vez que, apesar de formalmente ter saído, deixou mecanismos de controlo e ingerência fortalecidos.

No contexto dessa onda de ataques, houve alterações estruturais no país que o remeteram a uma relação de total subserviência e dependência políticas e económicas, principalmente das potências europeias e dos EUA. Falamos da privatização de empresas de setores importantes que pertenciam ao tecido empresarial do Estado português e que, apesar de geridas pela burguesia local, possuíam ainda alguma margem de manobra. Durante essas primeiras décadas do século XXI, o Estado e a sua burguesia perderam mão sobre o setor financeiro, sobre setores fundamentais como o setor energético, os transportes e as infraestruturas.

Portugal ficou remetido a um estatuto periférico, totalmente dependente de uma dinâmica imposta pelos interesses dos imperialismos europeu (UE) e norte-americano, em particular; um país onde a economia assenta no turismo e na exportação de produção de multinacionais que usam e abusam da localização geográfica do país (dos recursos naturais, independentemente de impactos ambientais), de apoios estatais, da precariedade e dos baixos salários.

A crise da “democracia” herdada do 25 de Novembro de 75

Este processo estrutural, que atravessou o país, lançou as sementes dos processos políticos a que desde então temos assistido. Depois de anos em que o movimento dos trabalhadores tomou a dianteira, o descontentamento foi canalizado pelo BE e pelo PCP para um governo do PS – a Geringonça – que desmoralizou uma geração que viu neste governo uma possibilidade de, pelo menos, recuperar o que havia perdido.

O fim daquele processo de lutas e dos governos da Geringonça, que não só não resolveram, como aprofundaram a crise social em alguns setores, como a habitação e a saúde, foram terreno fértil para o crescimento da extrema-direita, acompanhando assim a realidade internacional.  Este é o pano de fundo da crise política que leva a que os vários governos não consigam maiorias, porque a classe trabalhadora vê que, vira o disco e toca o mesmo, a sua vida vai de mal a pior.

PSD/CDS e PS: os responsáveis pelo estado do país

PSD/CDS e PS foram os grandes dinamizadores deste projeto de país, desde o fim do processo revolucionário, agravado desde a intervenção da Troika. O desgaste político com estes partidos vem exatamente das poucas diferenças entre os seus governos. Claro que os governos PSD/CDS têm sempre a necessidade de responder ao seu eleitorado mais conservador de direita, procurando hoje alavancar um discurso anti-imigração e securitário. Mas PS não se constitui como alternativa, sendo totalmente subserviente às regras do déficit da UE e responsável, por exemplo, por grandes ataques à educação pública, entre outros. Pela voz de Pedro Nuno Santos mostrou que também cede a esse discurso anti-imigração, e nada mudou nesse campo no seu governo.

Chega e Iniciativa Liberal: discursos diferentes, um grande ataque a quem trabalha

A extrema-direita, não fosse suficiente a história de miséria, guerra e sofrimento do fascismo, demonstra ao que vem: mais ataques para os trabalhadores, menos democracia e corrupção e criminalidade, como vemos no caso do Chega, a única bancada parlamentar com 20% de deputados a braços com a justiça.

De facto, o Chega, mas também a Iniciativa Liberal, apesar do seu discurso mais “clean”, têm acordo com este projeto de submissão às regras da UE do capital e ao imperialismo americano. Propõem medidas que só levam a um maior roubo nos nossos bolsos, com agravamento e aprofundamento do ataque ao setor público e aos direitos sociais e laborais dos jovens e dos trabalhadores, no ativo ou reformados. Escondido por detrás da defesa do “mérito” ou do ataque aos imigrantes, está de facto a proteção dos ricos e a destruição dos poucos apoios que as conquistas dos trabalhadores arrancaram ao Estado. Defender a lei do mais forte será sempre a destruição dos trabalhadores e inclusive da pequena burguesia.

PCP, Bloco de Esquerda e Livre: limar as arestas do capitalismo

A esquerda parlamentar, do PCP ao Livre, não apresenta soluções diferentes da reedição de uma Geringonça com o Partido Socialista, que já demonstrou distribuir migalhas da espoliação crescente do país, sem recuperar sequer os direitos que a Troika e o governo PSD/CDS de Passos Coelho roubaram. Um projeto falhado que demonstrou que combinar interesses dos trabalhadores com os dos patrões leva a água ao moinho destes últimos, em detrimento das condições de vida e de trabalho dos primeiros. 

Esta esquerda deixou de mobilizar a força dos trabalhadores para construir um mundo organizado de forma oposta ao capitalismo, para se limitar a propor medidas que atenuem os efeitos mais nefastos deste sistema. Na crise atual, está claro que esta não é a alternativa à barbárie do capitalismo, que se agrava de dia para dia.

É preciso organizar as forças por uma nova revolução, que rompa com este projeto de país e tenha claro que só haverá saída quando forem os trabalhadores, através dos seus organismos e auto-organização, a governar uma nova sociedade, sem exploração e sem opressão.