A convocatória de uma “grande greve de professores” para o dia 21 de junho por parte da generalidade das direções sindicais – com destaque para a FENPROF (CGTP) e FNE (UGT), maioritárias no setor – é um passo muito positivo porque, após vários anos de ‘letargia’, impulsiona a mobilização unificada e o debate na classe pelas suas reivindicações e, a partir deste facto, critica e denuncia o Governo de António Costa, tão largamente elogiado pela finança internacional e generalidade das instituições europeias pelos seus “sucessos económicos”. Por outro lado, expõe as limitações na condução da luta por parte dos dirigentes sindicais amarrados à maioria governamental PS, PC e BE, pelo que, além de apoiar a greve, é preciso que os professores se apoderem da sua luta!
Os professores e restantes trabalhadores da Função Pública continuam a perder salário e direitos
A generalidade dos trabalhadores do Estado tem pagado com os seus salários e outros direitos grande parte dos “sucessos económicos” dos últimos Governos de Sócrates, Passos Coelho e António Costa – nomeadamente a famosa descida do défice público.
Os professores, apesar das suas mobilizações, têm-no feito de forma particularmente notória desde os tempos da célebre Lurdes Rodrigues por via dos vários congelamentos da evolução na carreira (generalizados ou “seletivos”) que ocorrem desde 2005 e das mudanças de estrutura da carreira (via pela qual se foi perdendo salário e tempo de serviço), mas também por via do aumento da idade de reforma e das penalizações para a sua antecipação e por via do aumento do horário letivo e não letivo e do número de alunos por turma, que aumenta o desgaste e o ritmo de trabalho.
Para além disso, o aumento do número de professores contratados – a fim de substituírem os colegas efetivos colocados nas posições cimeiras da carreira que passavam à aposentação – tem galopado nos últimos anos, incrementando assim o desemprego, a precariedade e o roubo salarial na classe, já que os “contratados” não evoluem na carreira e ficam “eternamente” colocados no começo da carreira.
Finalmente, a generalização dos diretores omnipotentes, encouraçados numa estrutura de gestão onde se acoitam todo o género de “seguidores e seguidoras da máquina ministerial centralista” e de onde se afastam os professores mais críticos e rebeldes, pressiona e contribui para a letargia acima referida.
Costa tem-se apoiado na divisão da classe promovida pelos dirigentes sindicais
É verdade – repetimos – que estes roubos não têm atingido apenas os professores do Ensino Básico e Secundário, mas sim todos os trabalhadores da Função Pública (FP), desde os cantoneiros das autarquias ou auxiliares de educação das escolas com salários praticamente iguais ao SMN aos professores do Ensino Secundário e até Superior.
Mas a luta ampla, unida e eficaz dos cerca de 600 mil trabalhadores da FP que as políticas de austeridade hard ou soft de Passos e Costa poderiam ter unificado foi dividida pela forma como as direções sindicais, amarradas à defesa da maioria governamental, conduziram a contestação, permitindo a António Costa reinar através de cedências que não tocavam na essência do reinado da Troika-Passos.
Assim, após as mobilizações positivas dos últimos anos, a exigência e estratégia reivindicativas por parte das direções sindicais do setor (CGTP e UGT) para efetivação dos cerca de 100 mil “precários do Estado” (ou ‘regularização’ via PREVPAP – programa de regularização extraordinária de precários na FP – na linguagem negocial) excluía, afinal – para além dos precários das autarquias – os professores contratados pelo Ministério da Educação, o setor com mais trabalhadores em situação de precariedade.
O chefe da maioria governamental PS-PCP-BE, empenhado na sua “economia competitiva”, agradeceu e aproveitou esta estratégia divisionista para continuar a reinar: a uns concedeu uma lei apenas para os precários em funções entre 1 de janeiro e 4 de maio que se limita a abrir o concurso e dá aos chefes o poder de decidir o que é “uma necessidade permanente de um posto de trabalho” e prometeu uma outra lei final sobre o tema que está agora a ser negociada; a outros (trabalhadores das autarquias) promete outras leis de vinculação lá para ‘mais adiante’.
O resultado desta divisão na classe manifesta-se nas escassas 15 mil candidaturas efetuadas durante o primeiro mês de concurso, o que levou os próprios dirigentes sindicais a (auto) lamentarem-se: ‘A Frente Comum sabe que há medo perante o dirigente do serviço e o trabalhador tem receio de perder o emprego’ (Ana Avoila, dirigente sindical da Frente Comum, CGTP). Ou seja, os dirigentes sindicais semeiam ‘ventos’ e divisão; o trabalhador precário colhe ‘tempestades’ e medo.
A recusa em potenciar a unidade da luta do conjunto de todos os trabalhadores da FP foi particularmente notória no dia 26 de maio: nesse dia, os trabalhadores não docentes das escolas foram convocados pelas direções sindicais (CGTP) para uma greve em defesa de reivindicações em quase tudo semelhantes às dos professores, mas da qual foram afastados. No próximo dia 21 de junho, os professores estão convocados para uma outra greve (FENPROF/FNE (CGTP/UGT)), mas da qual os trabalhadores não docentes estão outra vez afastados!
Basta de direções sindicais comprometidas com a maioria governamental
O que as ‘greves divididas’ e a ‘meia greve’ de professores de dia 21 de junho têm em comum é a defesa e estabilidade do Governo de António Costa e da maioria governamental PS-PC-BE por parte dos seus dirigentes sindicais. Falta-lhes uma vontade e uma política de mobilização na base que construa uma greve efetiva que seja o primeiro passo para a continuação ainda mais combativa da luta. Na ausência dessa vontade, ficarão apenas as frases e palavras altissonantes das centrais sindicais, subsidiárias da “propaganda oposicionista responsável” que esconde o real comprometimento com o Governo de Costa.
Vejamos:
– no dia 21 de junho, 9 meses após o início do ano letivo, há muito que estão terminadas as aulas no Ensino Básico e Secundário do presente ano letivo, pelo que os laços entre os professores são mais dispersos e frouxos. Na ausência de uma ação unitária de mobilização no próprio dia (por exemplo, uma manifestação), ficará apenas o boicote exitoso aos exames nacionais convocados para esse dia como ‘ponto de encontro concreto e unificador’ da maioria da classe. Mas “a greve não é aos exames… o calendário legal que nos restou foi esse dia… coincidiu… os exames do dia 21 são apenas do 11º ano, e o Governo pode remarcar para outro dia…isso já foi feito no passado” (Mário Nogueira, TSF, 8 Junho). Mas a este estapafúrdio esvaziamento da combatividade acrescenta-se o compromisso de que a luta efetiva não prosseguirá, mesmo que a classe assim o queira ou que “estoire” com os exames desse dia: “…se os exames forem tirados e deslocados, a greve não se deslocará e é [apenas] naquele dia.”
– E se o “socialista” António Costa decretar os “serviços mínimos”, ou seja, o esvaziamento do direito à greve e da própria greve (como neste momento já é um facto), apoiando-se ainda na prepotência e abuso de muitos diretores, que já convocaram a totalidade dos professores para as vigilâncias? Novamente as palavras altissonantes com odor a luta esvaziam-se: “Nós agiremos de acordo com aquilo que for decidido. Ou seja, se não forem decretados serviços mínimos, não se farão; se forem decretados, far-se-ão. Não iremos entrar numa situação de desobediência (…)” (idem).
Os professores devem entrar na luta e apoderar-se dela
A forma burocrática de dirigir a luta e o comprometimento das atuais direções sindicais com a maioria governamental PS-PC-BE é o principal obstáculo à mobilização dos professores e da restante Administração Pública. Não tenhamos dúvidas: a recuperação dos direitos e salário retirados pela Troika-Passos apenas será possível com uma luta unicamente comprometida com a vontade da base e em luta, e não com as negociações dirigidas e controladas por aqueles “altos dirigentes”. Afastadas do controlo democrático da base, o objetivo central das direções sindicais é a negociação e não a conquista das reivindicações.
É por isso que dizemos que os professores devem apoderar-se da condução da sua luta, debatendo em cada escola – e mesmo em cada zona – os passos necessários para alargar esse controlo da luta, decidindo o que fazer em cada ação de luta e em cada negociação, se recusam ou não os famigerados serviços mínimos, quando fazem greve, etc.
A greve é da classe; tem que ser a classe a decidir!
Basta de austeridade! Todos à luta!