Após o 11 de Março de 1975, a situação política no país aqueceu. Dias depois, o processo de nacionalizações ganha importância na realidade. Assim, dia 14 e 15, nacionalizaram-se bancos e seguradoras; em abril, foi a vez das comunicações, energia e transportes, setor em que se incluía a transportadora aérea TAP. Hoje a nacionalização da TAP volta a estar na ordem do dia.
A nacionalização da banca teve como consequência que muitas empresas ficassem do lado do Estado e foi assim na TAP (65%). Contudo, só a 16 de abril de 1975, através de decreto-lei, a companhia é efetivamente nacionalizada e absorvidos os restantes 35% do capital. Este decreto é aprovado em Conselho de Ministros do IV Governo Provisório, onde estavam figuras como Mário Soares e Álvaro Cunhal. O decreto explicava que a companhia já estava “completamente dependente” do setor público à data da nacionalização através das garantias bancárias dadas pelo Estado Novo.
As nacionalizações expropriaram vários acionistas privados. Entre eles, o mais conhecido, pelo poder financeiro e diversidade de negócio, era a Companhia União Fabril (CUF), também com capital na TAP. A CUF, com fortes ligações ao regime, como o lema indicava “O que o País não tem, a CUF cria”, chegou a representar 5% do PIB nacional. O decreto que efetivava a nacionalização da companhia garantia, contudo, a indemnização aos privados, ficando desta forma o Estado com despesas acrescidas ao serviço dos patrões, como mais tarde se veio a confirmar.
O que a nacionalização trouxe
As nacionalizações garantiram os postos de trabalho. Na TAP, por exemplo, o Governo reconhecia a importância e centralidade da companhia aérea, bem como a especialização e elevado número de trabalhadores, cerca de 9000 à altura. Possibilitou ainda, como noutros setores, melhores salários. Três meses após a revolução, o salário mínimo na TAP estava nos 5.050 escudos, o que significa hoje mais de 800 euros; atualmente, o salário mínimo nas empresas do grupo coincide com o nacional: 635 euros. Para além disto, a nacionalização permitiu 40 anos de transporte aéreo seguro e de qualidade mundialmente reconhecida.
Privados suplicam pelo Estado
Humberto Pedrosa, acionista da TAP desde a privatização de 2015, afirmou no início de abril que a nacionalização da TAP “Seria dar um passo atrás”. Contudo, o empresário não se envergonhou para pedir ajuda ao Estado para financiar a TAP. O mesmo magnata dos transportes avança como hipótese urgente um empréstimo com garantia do Estado de 200-300 milhões de euros. Estes empréstimos têm sido a forma de os privados se financiarem e, se algo correr mal, não há melhor garante que o Estado. Foi já utilizado no processo de privatização da companhia em 2015 e na sua renegociação no Governo da Geringonça. Tudo bons negócios para privados à custa do nosso dinheiro.
Também o entusiasmante Miguel Frasquilho, Presidente do Conselho de Administração da TAP, foi ao Parlamento pedir ajuda, não afastando também a hipótese “extrema” de nacionalização. Avançou que a ajuda ao Estado já foi solicitada: através das garantias para empréstimos, na isenção de taxas para a Segurança Social e atraso na retenção do IRS dos trabalhadores, quer através do adiamento ou isenção de pagamentos de várias taxas (aeroportuárias, SEF, etc.) que reverterão, com certeza, numa fatura para todos nós. Recordamos que o layoff já está a ser uma ajuda por parte do Estado à companhia: 21 milhões de euros por mês.
Nacionalizar a TAP é também hoje salvar os postos de trabalho
O Governo também já fala de nacionalizar a TAP: Centeno, Vieira da Silva e Costa apressam-se a posicionar-se, dizendo que embora seja a solução “mais radical”, a nacionalização da empresa não está afastada, como forma de viabilizar a companhia.
Nós propomos que setores estratégicos estejam do lado dos trabalhadores e sob o seu controlo. Estas nacionalizações, contudo, têm de ser, ao contrário do que fez o governo provisório em 1975, sem indemnização. A solução “radical” ou “extrema” é a TAP estar nas mãos de privados e o Estado continuar a apoiar através de avais e garantias em empréstimos, perdão de impostos e taxas. Intervenção do Estado, sim, mas para ficar no setor público, ao serviço comum da sociedade, garantindo os postos de trabalho e um serviço seguro e de qualidade. Hoje, como em 1974-75, sabemos que dar milhões para salvar bancos e empresas são para ficarem nas mãos dos patrões. Nacionalizar sem indemnizar e garantir os postos de trabalho sem redução dos salários é a forma de ultrapassarmos esta crise.