A NOSSA CLASSE AVIAÇÃO

Defender empregos e direitos

As crises do capitalismo e a sua incapacidade sistémica de resolver problemas são de novo postos a nu pela situação gerada pela pandemia. Perda de salário, desemprego e despedimentos coletivos, insolvências, falências e planos de restruturação são palavras que estamos habituados a ouvir nos últimos anos. Palavras que nunca entreveem um bom futuro para a classe trabalhadora.

Insolvências a todo o custo

Dielmar e Coelima no setor do têxtil e Groundforce no setor da aviação são nomes de empresas nacionais que apareceram nos títulos e rodapés, nestes últimos anos, por casos de insolvência. As duas primeiras já vendidas a privados por um punhado de milhões, a última à procura de uma saída no marco de um plano de reestruturação. Contudo, não foram as únicas nesta turbina das insolvências, várias outras empresas também no setor do têxtil foram afetadas, como por exemplo a António Almeida e Filhos.

As insolvências são sempre más notícias para os trabalhadores. Umas piores outras menos, mas sempre más notícias. Nas saídas que se têm desenhado nas empresas insolventes ouvimos muitas vezes que se garantirão os postos de trabalho, não nos dizem é em que condições, pois não querem falar do pior. A aquisição e investimento por um novo acionista privado significará sempre cortes nos salários e nos direitos e, se for necessário mais tarde, no número de postos de trabalho.

TAP a torre de controlo da perda de direitos

Mas não é só o privado que se aproveita desta situação económica débil das empresas, entenda-se dos trabalhadores. O caso TAP é paradigmático. O “salvamento” da companhia aérea de bandeira, pelo governo “socialista”, com as regras da liberal União Europeia, resultou numa reestruturação na empresa que significou despedimentos e perda salarial para os trabalhadores nos próximos anos. Era assim ou era pior, não se cansava de dizer o Governo e a Administração. E os sindicatos e a Comissão de Trabalhadores compraram este discurso barato.

Este plano da TAP foi uma machadada não só para os trabalhadores da companhia, mas também para toda a classe trabalhadora. Serviu e servirá como referência para outras empresas, veja-se logo ao lado o que está a acontecer à sua filha Groundforce.

A saga da Groundforce continua

Desde o início da pandemia esta empresa despediu cerca de 1000 trabalhadores. Desde o início que a Administração fez de tudo menos importar-se com os trabalhadores, que ainda hoje sofrem com a situação. Por exemplo, em março de 2020, deu o incentivo de licenças sem vencimento para “proteger a saúde dos trabalhadores” quando já se vislumbrava o lay-off. Esta situação, que nunca foi corrigida, ao contrário da TAP que o fez, resulto que, em setembro passado, na contabilização de créditos para informar a Administração de insolvência, vários trabalhadores e trabalhadoras viram a sua progressão de carreira anulada pelo suposto “absentismo” das ditas licenças sem vencimento. Outra “pérola” é a aplicação que a Groundforce faz segundo “pareceres jurídicos e da ACT” das baixas por doença Covid ou quarentenas contarem para absentismo, o que pode implicar novamente a não subida de carreira para muitos trabalhadores. Tudo estratégias para cortar direitos e manter baixa a folha salarial de uma empresa lucrativa e tão estratégica e essencial para o país, como a greve de 17 e 18 de julho deste ano demonstrou.

Matosinhos, Altice e Banca empresas de milhões

A refinaria de Matosinhos, empresa que aqueceu a campanha das autárquicas, pertencente à GALP, que tem lucrado milhões com os preços dos combustíveis e onde o Estado ainda detém capital, é mais um exemplo da inoperância do Governo na defesa de postos de trabalho. À boleia do ambiente e da sustentabilidade, em vez de uma solução de reconversão que garantisse os postos de trabalho e os salários, a solução foi acabar e deixar cair uma empresa que representa muito para aquela região.

O caso da Altice (ex-PT) é, à semelhança da Galp de Matosinhos, mais uma empresa que lucra milhões e que à boleia da situação avançou com um despedimento coletivo de cerca de 250 trabalhadores. De forma tipicamente desordeira do quero-posso-e-mando, a Administração do agora grupo francês apreçou-se, logo em junho deste ano, a anunciar o despedimento coletivo, a arrumar os trabalhadores em causa na prateleira, afastando-os das funções e retirando-lhes acesso à empresa, uma situação ilegal, que configura assédio e que foi denunciada pelos sindicatos.

Na banca calcula-se que cerca de 2000 bancários serão empurrados para a porta da rua, na sua maioria nos maiores e mais lucrativos bancos, o Millenium BCP e o Santander. Mais um setor com lucros astronómicos e que aproveita a situação para acelerar o processo que vinha preparando de redução de agências e trabalhadores bancários. A resistência a estes despedimentos num setor que estava sem grandes lutas há mais de três décadas resultou numa manifestação conjunta e uma histórica greve no dia 1 de outubro.

Para além destas grandes empresas, milhares de trabalhadores do turismo – setor na pandemia em que houve mais despedimentos – e do pequeno comércio, viram as suas situações laborais piorarem, setores de baixos salários e muita precariedade. Quer seja por despedimento ou falsos despedimentos estes trabalhadores muitas vezes não contam para a estatística e vivem na pobreza recorrendo muitos deles a centros de acolhimento para pelo menos terem as refeições do dia.

A crise que estava latente antes da pandemia pode estar a ser resolvida por ela própria com os cortes e destruição do trabalho já feitos e por fazer, assim como com as injeções históricas de dinheiro por parte da maioria dos governos mundiais. Todavia, ficará uma fatura para pagar e não parece ser pouca.

5 anos Em Luta ao lado da classe trabalhadora

É urgente a classe trabalhadora organizar-se e tomar consciência de que o combate ao inimigo – Governo, capitalismo e suas instituições – tem de se dar através da unidade na luta contra os ataques em curso e os que aí vêm. Para tal há que construir um novo sindicalismo com aqueles que ainda querem de facto lutar e que não ficam em acordos-de-cavalheiros à mesa das negociações. Há que construir um novo sindicalismo independente de Governo e patrões e que, de facto, queira unificar as lutas pois é necessária uma força maior da classe trabalhadora. Além de um sindicalismo que dote os trabalhadores das melhores ferramentas de combate e resistência, é necessário um partido da classe trabalhadora que não se fique pelas disputas parlamentares, mas que se proponha a uma luta revolucionária contra o capitalismo. Num quadro em que todas as organizações abandonaram a revolução como objetivo real e concreto, é a estas tarefas que o Em Luta se tem dedicado ao longo dos últimos cinco anos e a que alguns dos seus militantes já se dedicam há décadas. No aniversário de 5 anos da nossa jovem organização, queremos lançar um convite a todos a virem construir uma organização que entende que lutar lado a lado com os trabalhadores significa manter a busca revolucionária por uma sociedade socialista.

Carlos Ordaz

Texto originalmente publicado no jornal Em Luta N.º 31 (Out. 2021)