O atual Primeiro-Ministro esteve, durante vários anos, à frente da Câmara de Lisboa. Hoje, a capital do país é a cidade do turismo e dos ricos, mas também dos baixos salários, expulsando a população trabalhadora para a periferia. Nestas Autárquicas, é preciso perguntar: é este o modelo de cidade que queremos? É possível fazê-lo com Geringonças locais? Só a partir de um posicionamento claro sobre esse tema, podemos construir um projeto ao serviço dos trabalhadores.
António Costa e a Lisboa dos ricos
António Costa saiu de Lisboa, mas Medina continua o seu projeto de cidade capitalista e de exclusão. O caso do João, que trabalha num hotel e ganha o salário mínimo, com contrato precário, e tem de ir viver para a periferia, é o exemplo de milhares a quem o baixo salário nega o direito à cidade. A Lisboa do PS é, por isso, a cidade das elites económicas, que expulsa os trabalhadores e a população mais pobre.
Este modelo está intimamente ligado à divisão de trabalho na UE, que tem para Portugal um projeto de país de turismo, salários baixos e emprego precário. É por isso que o país de Costa gira em torno dos serviços (facilmente deslocalizáveis) e do turismo (volátil). A consequência é uma brutal especulação imobiliária e um nível de vida incomportável, ao mesmo tempo que se mantêm os problemas estruturais da habitação, emprego, transportes, apoios sociais e serviços públicos.
A hipocrisia da direita
PSD e CDS foram responsáveis pela privatizações dos transportes públicos, pela lei das rendas, pelo corte no financiamento autárquico via fim de freguesias e por um longo rol de austeridade. Por isso, é de uma hipocrisia sem limites que Assunção Cristas e Teresa Leal venham agora falar de “devolver Lisboa às pessoas”. Mas para demonstrar que a direita representa o que há de mais asqueroso no debate autárquico, poderíamos ainda acrescentar a corrupção e o compadrio (onde se inclui o PS) e a campanha de André Ventura em Loures (PSD), que vem mostrar o projeto racista, machista e de cidade “higienizada” que este partido nunca deixou de ter.
Esquerda não apresenta alternativas
PCP e BE candidatam-se de forma autónoma e separada do PS, mas não apresentam alternativa, pois defendem reforçar as suas votações com o objetivo de construirem Geringonças locais.
Ricardo Robles (BE) tem como centro o ataque à direita (que já não governa nem o país nem Lisboa) e fala de uma cidade para todos, mas alia-se aos responsáveis da cidade dos ricos, como Medina e Costa, e defende uma Geringonça em Lisboa. O mesmo na candidatura Cidadãos por Coimbra, integrada por BE e MAS e defensora de uma Geringonça Coimbrã.
O PCP também já se afirmou disposto a uma aliança pós-eleitoral com Medina em Lisboa e governa com o PSD nas Câmaras de Loures e Beja (aqui com enorme discriminação das comunidades ciganas). As suas governações são responsáveis pela manutenção de situações degradantes em bairros como as Terras da Caparica e do Torrão (Almada) e o bairro Jamaica (Seixal). Na Amadora e em Loures, partilham responsabilidade (com o PS) na manutenção dos guetos urbanos. Os transportes precários na Margem Sul ou em Loures são ainda expressão dos problemas de gestões que não rompem com os interesses do grande capital.
Geringonças locais = cidades para ricos
Como combater a precariedade nos municípios se a Geringonça excluiu os trabalhadores locais do programa de regularização de precários (PREVAP)? Acabar com a expulsão dos citadinos das áreas centrais das cidades aliados ao PS da especulação imobiliária? Expandir o metro ou melhorar serviços públicos apoiando o PS dos cortes orçamentais para reduzir o défice?
Nas cidades, nas periferias e nos municípios do interior, os trabalhadores e a população mais pobre têm interesses irreconciliáveis com patrões, banqueiros, lobbies imobiliários e a União Europeia austeritária que o PS representa.
As Geringonças locais, tal como a nacional, continuam atadas aos interesses das classes dominantes, pelo que não conseguem devolver as cidades aos trabalhadores, negros, mulheres e população pobre. BE e PCP, por não romperem este projeto de conciliação de classes com o PS (local e nacional), abdicam do direito à cidade para os trabalhadores e a população mais pobre. Por isso, não devemos apoiar o “mal menor” do BE ou PCP – como escolheu fazer parte da esquerda (por exemplo, o MAS) -, mas sim contribuir para a criação de um campo independente dos trabalhadores, fazendo valer a sua vontade na concretização de uma cidade plural e, efetivamente, inclusiva.
Nem geringonça, nem direita
Nestas eleições, chamamos a não votar nem na Geringonça (PS-PCP-BE e partidos que a sustentam, como o Livre), nem na direita (PSD, CDS), nem nas listas de supostos independentes que, como Rui Moreira e Isaltino Morais, levam a cabo o mesmo modelo e projeto político da direita e do Governo. Apesar de sabermos que é difícil conhecer toda a realidade nacional e aceitando que, pontualmente, possam existir projetos locais que representem os interesses dos trabalhadores (como nos parece ser a candidatura de Vasco Santos, pelo MAS, à Câmara de Barcelos), apontamos, em geral, para o voto nulo nas próximas eleições.
Construir uma alternativa para os trabalhadores!
Sabemos que nas eleições predomina o jogo de cartas marcadas, da corrupção, dos lobbies da construção civil, dos negócios com a água, o lixo e os transportes e dos interesses privados em torno da saúde e da educação. Para construir cidades para os trabalhadores, é preciso romper com os interesses instalados localmente e o espartilho do défice, da dívida e da UE. É preciso que sejam os trabalhadores a administrar e governar as cidades quotidianamente e não apenas votar de 4 em 4 anos ou escolher propostas laterais nos Orçamentos Participativos.
Por isso, uma verdadeira “cidade partilhada” só poderá ser concretizada se construirmos uma alternativa independente dos trabalhadores, oposta à direita e à geringonça. O direito à cidade, tão falado nessas eleições, virá da auto-organização dos subalternos nos bairros e nas empresas.
O Em Luta não pode candidatar-se nestas eleições, mas procura contribuir quotidianamente para a construção desta alternativa. Elencamos aqui algumas propostas que nos parecem um ponto de partida para a mobilização, pois não podemos esperar que as Assembleias Municipais decidam: é preciso lutar no dia a dia. Como mostraram os moradores da Rua dos Lagares contra o seu despejo, na Mouraria, e os trabalhadores da Autoeuropa na sua greve, é através da mobilização, solidariedade e luta dos mais explorados e oprimidos que será possível conquistar direitos.
5 PROPOSTAS PARA CIDADES DOS TRABALHADORES
DIREITO A VIVER NA CIDADE
Habitação Social mais abrangente e melhores condições das casas e áreas circundantes.
Contra a especulação imobiliária, estabelecimento de teto máximo para rendas, limitação do número de casas AIRBN e alojamento local, impedimento à venda de património municipal, requalificação de edifícios devolutos para habitação com rendas acessíveis.
Plano de obras públicas para combater o desemprego e melhorar habitação e infraestruturas.
DIREITO AO ACESSO À CIDADE
Nacionalização dos transportes públicos para garantir uma rede integrada e com qualidade entre cidades e periferia, garantindo serviços públicos e não interesses privados.
Redução de 50% nos preços dos passes e bilhetes, gratuitidade para estudantes e reformados e aumento da regularidade, horários e abrangência geográfica. Prioridade à ampliação do Metro à periferia de Lisboa.
CIDADE COM SERVIÇOS PÚBLICOS DE QUALIDADE
Fim das empresas subcontratadas nos serviços municipais; remunicipalização do lixo, água, obras e jardinagem para reduzir drasticamente preços, melhorar serviços e garantir emprego de qualidade.
Centros de saúde com médicos de família para todos.
Creches e escolas públicas, gratuitas e de qualidade que cubram toda a população.
CIDADE COM TRABALHO DIGNO
Inclusão dos trabalhadores locais no programa de integração de precários do Estado (PREVAP).
Mais trabalhadores, aumentos salariais e contratos dignos para garantir serviços públicos de proximidade adequados. Fim da substituição de postos de trabalho por Contratos Emprego-Inserção.
Redução geral do horário de trabalho para as 35h para criar mais postos de trabalho.
CIDADE SEM RACISMO
Fim da criação de guetos, bairros isolados e deixados ao abandono, sem infraestruturas e acessibilidades. Fim dos despejos e da destruição de bairros e casas.
Fim das rusgas e violência policial nos bairros, punição dos culpados e discussão de um novo modelo de segurança com as populações.
Direito à nacionalidade para todos os nascidos em Portugal e regularização dos imigrantes em situação irregular.
Maria Silva