O consórcio francês Vinci, que detém a concessão dos aeroportos portugueses até 2062, assinou no passado dia 8 de janeiro um acordo com o governo para aumentar a capacidade aérea de Lisboa. A solução decidida foi “Portela + Montijo”.
Este acordo prevê um investimento de 1750 milhões de euros até ao fim da concessão – ao que parece totalmente comparticipado pela empresa francesa -, compensada com a possibilidade de esta aumentar ainda mais as taxas aeroportuárias. A principal entrada de turistas na capital e no país terá com este acordo a ambição de aumentar em 70% o número de passageiros. Em 2018, já foram 29 milhões que entraram pelo aeroporto da Portela; estima-se com esta solução chegar à cifra dos 50 milhões.
Montijo: um recurso embaraçoso
Este acordo assume a manutenção do Aeroporto da Portela, premiado com a maior fatia do investimento: 650 milhões de euros. Para o Montijo estão previstos 520 milhões de euros; os restantes 160 milhões serão para a força aérea e acessibilidades, ficando 421 milhões para aplicação até ao fim da concessão. É, portanto, desleal falar-se em segurança dos voos para a cidade de Lisboa quando a Portela mantém o papel principal do guião.
As médias de crescimento da Portela são das mais altas na Europa; desde 1970 nunca cresceu menos de 5% e a partir de 2010 apresenta sempre crescimentos com dois dígitos. A solução foi-nos apresentada como de “futuro”, mas, aplicando os dados mais conservadores, conclui-se que o binómio estará saturado em 12 anos.
Fica evidenciado o privilégio à “Vinci-Construtora”, onde os aviões aterrarão no aeroporto da “Vinci-Aeroportos” e passarão pela ponte da “Vinci/Infra-estruturas” (a Vinci detém 37% da Lusoponte, concessionária das pontes Vasco da Gama e 25 de Abril), um óptimo negócio para a multinacional francesa!
A solução causa mau ambiente
Em 2018, a VINCI entregou um estudo à Agência Portuguesa do Ambiente (APA), sem consulta pública; a agência, por sua vez, comunicou as preocupações sobre o mesmo e pediu a elaboração de um novo. Sem ter este novo estudo, o governo decidiu “Portela + Montijo”, tendo Costa asseverado que “não havia plano B”, numa clara tentativa de pressionar a APA. Embora tenha recuado mais tarde na afirmação unilateral, este autoritarismo começa a ser conhecido – sabemos o quanto é fã de defender os interesses das empresas à frente dos trabalhadores e da população.
Os estudos ambientais têm uma importância vital, pois os aeroportos são locais extremamente poluentes: emissões, ruído, etc. Mas com o aumento de emissões que provocará mais voos em Lisboa (os aviões a serem dos maiores emissores de dióxido de carbono e de vários outros elementos químicos para a atmosfera), o anúncio do governo de ser emissor neutro de dióxido de carbono em 2050, parece mais uma miragem.
Além disso, o aeroporto do Montijo terá ainda um importante impacto no habitat natural da região, que é uma zona de salinas, onde existem diversos tipos de aves (flamingos, por exemplo), além de que o ruído e o aumento de movimento na ponte vão afetar muito a qualidade de vida das populações na região.
Que transporte aéreo queremos?
Além disso, um novo aeroporto e um plano de transportes adequados têm de estar associados a melhores direitos para os seus trabalhadores. O triplicar dos voo nos últimos dez anos não foi acompanhado de crescimento correspondente de funcionários aeroportuários, levando a uma crescente exploração e a cada vez piores condições físicas de trabalho, num aeroporto completamente sobrelotado. Pelo contrário, foi lado a lado com a diminuição dos salários, a generalização da precariedade e da penosidade dos seus horários. Queremos um aeroporto que sirva a população e, para isso, necessita de uma estrutura virada não para o lucro comercial, mas para o conforto dos passageiros e condições de trabalho dignas aos seus funcionários. Uma Portela+Montijo, ao manter os remendos do costume não resolve.
Temos que cortar com a lógica privada na aviação e nos transportes. Só um plano de transportes nacional e europeu coordenado, com comboios e outros transportes menos poluentes, conseguirá melhorar a mobilidade das populações e resolver o problema do ambiente.
Carlos Ordaz
Texto publicado originalmente no jornal Em Luta, nº 13 (março de 2019)