Como parte da delegação portuguesa estiveram presentes, entre outros, Luciano Silva, dirigente sindical do Sindicato dos Trabalhadores do Sector Automóvel – STASA e membro da Comissão de Trabalhadores da VW Autoeuropa, e Francisco São Bento, dirigente sindical do sector dos transportes, ex-Presidente do Sindicato Nacional de Motoristas de Matérias Perigosas – SNMMP, que o Jornal Em Luta entrevistou.
Em Luta (EL) – No passado mês de abril aconteceu o IV Encontro Internacional da RSISL em Dijon. No contexto atual que se vive no mundo como comentas a importância de um espaço de reunião, troca de experiências e preparação de lutas do sindicalismo combativo de todo o mundo?

Francisco São Bento (FSB) – Considero estes encontros internacionais de uma enorme importância, bem como essenciais no âmbito laboral contemporâneo. Muitas das adversidades profissionais e sociais são transversais – atravessam fronteiras – e devem ser combatidas de igual modo. Um excelente exemplo disso é o setor do transporte rodoviário de mercadorias, que é regulado por Leis (Regulamentos e Diretivas) que abrangem todos os países da União Europeia (UE), tornando-o assim num setor em que é imperativa a internacionalização sindical.

Luciano Silva (LS) – Gostaria antes de mais de agradecer ao Em Luta pelo convite de participar nesta entrevista. Para o STASA este encontro foi muito importante, principalmente depois de uma pandemia que nos obrigou a um distanciamento muito prolongado. Para o STASA, este encontro tem uma importância comparável ao ligar dos máximos do carro durante uma viagem noturna, porque nos permite antecipar e perceber a nossa realidade através da troca de experiências com sindicalistas de outros países e setores. Normalmente, o capitalismo e as multinacionais adotam estratégias concertadas, e nesse sentido é fundamental esta troca de experiências entre os trabalhadores. Um exemplo deste intercâmbio de experiências foi a informação que nos chegou do que se passa em Espanha com a “transição energética”, onde apesar dos investimentos privados e estatais para a construção do carro elétrico, os trabalhadores se vêm ameaçados de milhares de despedimentos.
EL – Um dos temas em debate foi a guerra de invasão russa da Ucrânia. Como vês o que se passa na Ucrânia e a relevância que tem tido a participação de uma parte do movimento sindical? E qual o papel que poderá ter o movimento dos trabalhadores na defesa e apoio ao povo ucraniano?
LS – O momento alto do encontro foi a presença da delegação ucraniana, que nos trouxe relatos de um cenário de guerra com as consequentes atrocidades, coisa a que nenhuma pessoa e nenhum sindicato pode ficar indiferente. Relativamente ao tema, a nossa posição é que estamos diante de uma guerra de invasão: existe um país invasor, a Rússia, e um invadido, a Ucrânia. Para nós, este último tem direito a escolher o seu rumo, qualquer que ele seja. Esta guerra tem impacto internacional, nomeadamente com a migração de milhões de refugiados. Não podemos ficar indiferentes. O STASA apoiou neste encontro a realização de um comboio de apoio à resistência ucraniana que chegou no 1º de Maio a Lviv para levar apoio à resistência ucraniana e comemorar o Dia Mundial do Trabalhador junto de sindicatos do país. Achamos ainda importante a realização de mais atividades neste sentido como a que estamos a procurar organizar em Portugal junto do movimento sindical.
FSB – Independentemente das motivações geopolíticas que possam estar na génese desta guerra, ninguém pode ficar indiferente perante o sofrimento do povo ucraniano. Esta intervenção bélica – à semelhança de outras – é incompreensível e inaceitável. Toda a ajuda à população é essencial e o movimento sindical deve tentar contribuir também. Estamos a falar de trabalhadores e trabalhadoras, que de um dia para o outro se viram privados de tudo, nomeadamente dos seus postos de trabalho, das suas casas, entre muitas outras coisas, e precisam de todo o apoio possível.
EL – Globalmente e num contexto de inflação crescente e de flexibilização dos direitos laborais, como vês a importância destes encontros para a tua atividade sindical em Portugal?
FSB – Reitero que os encontros sindicais são de uma importância enorme e reforçam o know-how dos sindicatos envolvidos, nomeadamente em matérias de inflação e flexibilização dos direitos laborais, entre outras. No entanto, quer as questões supracitadas, quer qualquer outra, não podem continuar a ser implementadas apenas com o intuito de proteger o lucro das empresas em detrimento dos direitos de quem trabalha e gera esses mesmos lucros. As crises económicas são uma realidade, mas devem ser mitigadas de forma mais justa e equitativa e em boa parte pelos lucros extraordinários que as crises por vezes criam em determinados setores económicos.
LS – Estes encontros têm uma importância fundamental porque nos dão uma perceção global do mundo do trabalho. Penso que estamos diante de grandes mudanças, que já começaram com a indústria 4.0 e que agora com a pandemia e a guerra deverão acelerar. Na cadeia produtiva, a guerra de invasão da Ucrânia e as sanções à Rússia estão já a trazer consequências. Portanto o papel importante destes encontros é não só o intercâmbio de experiências, como também a concertação de ações e de posicionamentos do movimento sindical, como são exemplo a luta pela redução da jornada de trabalho sem redução salarial, a defesa dos setores oprimidos entre os trabalhadores, como as mulheres. Só assim, organizados nacional e internacionalmente, poderemos resistir aos ataques do capital e, assim, defender os direitos dos trabalhadores.