Internacional

Nem UE nem EUA/NATO querem uma Ucrânia livre, independente e soberana

Vimos recentemente a declaração do ex-Secretário de Estado norte-americano Henry Kissinger a defender que a Ucrânia ceda território à federação russa para acabar com a guerra e que a UE faça pressão para tal acordo.

Para além da declaração de Kissinger, cada vez mais os diferentes atores internacionais defendem a ideia de um acordo de paz, que de conteúdo significaria a capitulação ucraniana.
Fica por isso nítido que tanto a UE como os EUA apoiam a Ucrânia nesta guerra apenas no discurso, pois as suas medidas e atuação estão ao serviço dos seus interesses materiais.
O mundo foi surpreendido pela resistência ucraniana. A guerra, que está próxima de fazer 4 meses, é um entrave económico para uma economia mundial fragilizada com a pandemia. Por isso, a saída negociada, com a cedência de Donbass a Putin, é o objetivo da UE e do imperialismo norte-americano.
Não interessa ao imperialismo nem uma vitória de Putin, nem muito menos da resistência ucraniana. Este acordo permitiria acabar com a guerra, que já é um grande problema para a burguesia imperialista, sem significar uma vitória absoluta de Putin, e ao mesmo tempo esmagaria a resistência ucraniana. O grande empecilho para isso é a força e dinâmica da própria resistência ucraniana, que colocou as massas a armarem-se e a reagir contra a invasão russa.

O que ganha os EUA com isso?

Recentemente o congresso dos EUA aprovou o maior pacote de ajuda externa a um país onde não tem tropas. Apesar da propaganda, o pacote contém uma grande parcela de compra de material militar para o próprio stock norte-americano e também para garantir mais tropas para a NATO. É, por isso, insuficiente para de facto fazer vencer a resistência ucraniana. A “ajuda” norte-americana serve em primeiro lugar para avançar no projeto imperialista na Europa, na subordinação da Ucrânia e no fortalecimento da NATO.
Até o momento, apesar daqueles que insistem afirmar que a guerra de Putin é anti-imperialista, o facto é que a invasão de Putin à Ucrânia serviu para fortalecer o imperialismo norte-americano e a NATO, que vinham de uma crise com a instabilidade política nos EUA e a derrota do Afeganistão. Tanto a rutura forçada da aliança energética entre Alemanha e Rússia, como a localização privilegiada dos EUA para a comercialização do gás natural liquefeito, no marco do projeto de “transição verde”, ajudam aos EUA a se relocalizarem para uma futura recuperação.

E quais são os reais “valores europeus”?


O imperialismo europeu, muito mais afetado pela guerra do que o norte-americano, mantém uma política de convivência com Putin ao mesmo tempo em que envia apoios insuficientes à Ucrânia.
Foi recentemente aprovado o 6º pacote europeu de sanções à Rússia, que contém uma séria de concessões aos países europeus para que continuem a comprar petróleo e gás russo. Desde o início da guerra os países membros da UE pagam 260 milhões de euros por dia pelo petróleo russo, enquanto a verba para compra de material de guerra para Ucrânia é de apenas 500 milhões de euros.
Os EUA tem como projeto substituir a dependência enérgica da Europa em relação à Rússia por uma dependência ao imperialismo norte-americano. A suspensão do Nord Stream II é uma derrota para o imperialismo alemão e uma vantagem para os EUA.
Por outro lado, o aumento do financiamento bélico, tanto em relação à NATO, que vem se fortalecendo agora com a possibilidade de adesão da Suécia e da Finlândia, como dos próprios países membros, a começar pelo rearmamento da Alemanha, é outra demonstração de que o imperialismo se fortalece com a invasão de Putin à Ucrânia.
A guerra económica que o imperialismo impulsiona não tem nada a ver com as necessidades do povo ucraniano, mas sim vai ligada aos interesses das grandes corporações norte-americanas e europeias, na sua luta com a Rússia, com a China em segundo plano, na sua batalha por fortalecer a sua hegemonia.

O programa revolucionário passa por defender uma Ucrânia livre, independente e soberana


Estamos convencidos de que a política revolucionária hoje deve passar por defender e apoiar ativamente a resistência ucraniana contra a invasão de Putin. Pois esta guerra é uma guerra de agressão nacional e a derrota de Putin significaria um exemplo para os povos oprimidos no mundo.
Defender a resistência ucraniana passa por exigir para a Ucrânia as condições de defesa, principalmente armas, e também o enfraquecimento da Rússia. E passa, principalmente, por convencer os trabalhadores por todo mundo da necessidade do apoio ativo a esta resistência, como fizeram os estivadores da Inglaterra, da Suécia e da Holanda, que se recusaram a descarregar o petróleo Russo, porque era “sujo de sangue do povo ucraniano”. Assim como o comboio de solidariedade que a CSP CONLUTAS do Brasil e o Solidaires de França enviaram aos trabalhadores ucranianos.
Por outro lado, defender a resistência ucraniana passa também por denunciar e desmascarar o imperialismo europeu e norte-americano. Costa foi a Kyiv defender a entrada da Ucrânia na UE, ao mesmo tempo em que essa resiste em parar de enviar dinheiro para Putin através da compra do petróleo e do gás. Kissinger defende a capitulação ucraniana para o fim da guerra, enquanto os EUA aproveitam a guerra para debilitar a Rússia e aprofundar a dependência da Ucrânia e também da UE.
Nem a entrada na NATO e tampouco na UE são soluções para o povo ucraniano. Tal medida só significaria mais submissão e dependência. A proposta de Macron, em que coloca a possibilidade de estabelecer os países membros da UE de primeira e de segunda, é mais uma demonstração que para a Ucrânia a entrada na UE significaria a rapina europeia e nunca a sua reconstrução e desenvolvimento para o seu povo.
Assim, tampouco acreditamos que Zelensky defenda consequentemente uma Ucrânia livre. Zelensky teve a sua candidatura apoiada por Ihor Kolomoisky, uma das figuras mais ricas e poderosas do país, como também batalha por uma Ucrânia submissa à NATO e à União Europeia.
Uma saída independente para o povo ucraniano constrói-se no marco da resistência ucraniana, aprofundando a organização dos trabalhadores e construindo uma saída revolucionária.
O futuro da Ucrânia passa pela revolução socialista. Impulsionando a luta internacional, estendendo a revolução aos outros países da Europa. A vitória da resistência ucraniana, de um povo armado, seria um bom impulso para os “Estados Unidos Socialistas da Europa”, uma Europa dos trabalhadores e dos povos oposta à União Europeia dos ricos.

Por Joana Salay