Quer seja pelo aumento das taxas de juros e o seu impacto nos empréstimos de quem comprou casa, quer pelo aumento do arrendamento das casas – que só na AML (Área Metropolitana de Lisboa), nos últimos 5 anos, foi de 40% segundo dados publicados, pressionada pela especulação imobiliária, o turismo e o alojamento local.
Os bancos centrais dos Estados Unidos e do Reino Unido foram os primeiros a aplicar a política de aumento das taxas de juros com o objetivo de controlar a inflação. Passados uns meses foi a vez do Banco Central Europeu (BCE), que no início deste mês anunciou novo aumento da Euribor, colocando as taxas de 6 e 12 meses em valores só vistos há 12 anos.
Está, portanto, aberta a porta da memória de há anos atrás do impacto que teve na vida dos trabalhadores o aumento das taxas dos seus empréstimos e toda a austeridade acrescida aplicada pelo governo, FMI e União Europeia. A triste constatação é que, passados estes anos, o Governo da Geringonça e hoje o PS maioritário não reverteram a austeridade e não melhoraram o poder de compra dos nossos salários, independentemente dos aumentos aplicados ao salário mínimo, agora agravados pela alta da inflação.
Governo e autarquias sem política pública de habitação
A preocupação do governo e das autarquias que colocam o problema da habitação nos seus programas como de extrema importância a resolver, acaba na hipocrisia habitual de não terem uma verdadeira política de habitação social que garanta habitação digna para todos e de a encararem com programas municipais irrisórios, mas com grande propaganda e divulgação. Também não querem saber se desalojam pessoas com desculpa de perigo de proteção civil como se o problema não fosse já possível resolver há anos. Foi assim no mês passado no Bairro do Segundo Torrão em Almada, ou em Alfama, bairro histórico da capital, hoje cada vez mais largado ao alojamento local.
Governo preocupado com os “nómadas digitais”, mas não com a habitação para a maioria
Com impacto sobretudo nos grandes centros urbanos de Lisboa e Porto os “nómadas digitais” estão também eles a influenciar o preço das casas e dos quartos nas grandes cidades. Para termos ideia do impacto deste fenómeno, segundo a InvestPorto “agente público de promoção do investimento direto português e estrangeiro no Município do Porto “, ligado à Camara Municipal do Porto, no segundo trimestre deste ano, quase 11.000 “nómadas digitais” chegaram ao Porto. Contudo, é Lisboa, segundo um site referência para estes “nómadas”, a cidade mundial que ocupa o primeiro lugar nas preferências de destino, mesmo com um custo médio de vida de 3345 dólares mensais, bem reveladores do preço das casas na capital do pais. Este fenómeno explica também em grande parte a dificuldade dos estudantes universitários em arranjarem quarto para o ano letivo, agravada pela ausência de residências universitárias ou qualquer outra alternativa.
Para “resolver” a situação o governo lançou no final de outubro os vistos “nómadas digitais” para cidadãos de fora do espaço europeu viverem no país sozinhos ou com as suas famílias, com critérios bastantes acessíveis. Não resolvendo o outro lado, que é o problema da habitação nas cidades para a maioria da população e do arrendamento de quartos para estudantes deslocados.
A habitação tem de ser um verdadeiro direito
A habitação ser um direito não passa de mera letra escrita na Constituição para governo e autarquias. As suas políticas preocupam-se com o investimento privado e um divulgado progresso das cidades afastado dos seus residentes. Estes que têm sido obrigados a afastarem-se dos centros das cidades à procura de casas mais baratas ou a ficarem até desalojados, colocando-os na indigência de uma vida de rua.
É preciso parar acabar esta situação repovoando as cidades, requalificando as centenas de edifícios municipais que existem para habitação social, tomando para as autarquias os milhares de imóveis desocupados (muitos deles em risco de derrocada), controlando efetivamente os preços das rendas em valores relativos aos salários reais e controlando publicamente os empréstimos à habitação existentes em toda a banca. Só assim a habitação será de facto um direito.