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10 razões por que os trabalhadores têm de estar contra este Orçamento de Estado (OE)

O Governo de Costa propõe um OE que protege os banqueiros e grandes empresários e ataca os trabalhadores. Não há no OE2023 um projeto de fundo para o país fora do lugar periférico de fornecedor de serviços, turismo e baixos salários, com os custos sociais e ambientais que isso tem. É preciso um plano de luta dos de baixo que ponha as necessidades coletivas dos trabalhadores e pensionistas acima dos interesses dos banqueiros e capitalistas milionários.

1. Reduz salários

O Governo propõe uma média de 5,1% de aumento salarial. No caso da Função Pública, os aumentos variam entre 8% para os salários mais baixos e 2% para salários mais altos. O salário mínimo aumenta para 760€ (7,8%). Em todos os casos, estes valores são abaixo da inflação, que em setembro já chegou a 10,7%. Mas os aumentos nos alimentos vão além dos 15% e na energia mais de 24%, quando estas são o centro dos gastos dos trabalhadores e pensionistas. Por isso, as propostas de aumentos do governo não repõem a perda de poder de compra e legalizam a redução de salário, acentuando a crise social em curso.

2. Corta nas pensões

O Governo adiantou, em 2022, metade do que seria o aumento das reformas, mas reviu a medida de cálculo de pensões e diminuiu para metade os aumentos previstos para o próximo ano. Além disso, a parte das pensões agora paga não entrará no valor base a ser levado em conta quando se calcular o valor das pensões para 2024. Ou seja, estamos perante um corte real das pensões e de incumprimento do aumento já acordado anteriormente. Quando os pensionistas são dos setores mais expostos à pobreza em Portugal, isto é particularmente grave.

3. Não combate a pobreza e a precariedade

O aumento de 8% do Indexante de Apoios Sociais (a partir do qual se calculam Subsídio de Desemprego, Abono de Família e Rendimento Social de Inserção) fica também abaixo da inflação real, o que, juntamente com a redução real dos salários, reforça o empobrecimento geral da população.

O OE2023, apesar de aumentar mais dois dias de indemnização por despedimento (de 12 para 14 dias), está muito longe dos 30 dias anteriores à Troika, mantendo a facilidade dos despedimentos. Além disso, não tem medidas que combatam a enorme precariedade, o crescente trabalho informal e os falsos recibos verdes, o que reforça a pobreza ao significar salários 25 a 40% mais baixos.

4. Continua a permitir o roubo nos preços e lucros milionários

A inflação é puxada pela quebra das cadeias de produção causada pela pandemia e reforçada pela instabilidade da guerra na Ucrânia. Mas, acima de tudo, é produto da ganância dos grandes capitalistas em subir brutalmente os preços. Perante isto, o OE2023 não tem resposta. As descidas pontuais nos impostos sobre o consumo (IVA), como no caso dos combustíveis, não garantem preços baixos no consumidor e são aproveitados para fazer mais lucros pelas grandes empresas. O OE não toca nos lucros dos milionários (em particular nos bancos, energia e distribuição) e recusa-se a apresentar uma política de controlo e fixação dos preços, a única que, junto com uma política de renacionalização dos setores estratégicos da economia, poderia conter verdadeiramente a inflação.

5. Não resolve os problemas da habitação

O número de incumprimentos e despejos cresce todos os dias. O OE propõe reduções do IRS a quem tem empréstimos habitação que não contêm a brutal subida das prestações pelo aumento da taxa de juros. Tabela em 2% o aumento das rendas, quando os valores das rendas já eram um absurdo, abre a porta ao descongelamento das rendas mais antigas e não impede a nova manobra dos senhorios de não renovar contratos para aumentar ainda mais as rendas. Além disso, estimula-se a especulação imobiliária em torno do turismo e dos “nómadas digitais”, permitindo “as cidades para ricos”. Era preciso que o OE incluísse o controlo do valor das rendas e dos empréstimos à habitação, anulando os aumentos em curso e impedindo a não renovação dos contratos. Acima de tudo, o OE não tem uma política de habitação pública a custos controlados, de construção e recuperação de edifícios públicos em larga escala, que garanta habitação para todos e imponha uma real baixa dos preços de mercado.

6. Sem alternativa para a crise energética

O OE prevê um aumento da despesa na área ambiental, embora ainda residual no total do OE. Um dos centros está na renovação das frotas automóveis: financia-se o negócio verde da indústria automóvel, mas não se ataca o problema central de ter verdadeiros sistemas de transportes públicos coletivos e de qualidade nas cidades (e entre elas) que possam, com qualidade, garantir uma substituição do transporte individual, o que implica infraestruturas e profissionais. Não se questiona o impacto ambiental do aumento dos voos e dos cruzeiros, nem há política ambiental para a transição na indústria. Sobre os fogos, não muda o controlo da indústria da celulose sobre a propriedade e projeto florestal. Vendem-se grandes projetos energéticos como o da linha de alta velocidade, mas mantém-se o abandono da linha férrea no interior do país. Esconde-se o impacto ambiental da mineração do lítio ou do traçado do gasoduto ibérico numa zona protegida como o Douro. No caso da água, não se atacam os gastos desproporcionais da exploração agrícola intensiva, como a do olival no Sul, ou os gastos das piscinas nos hotéis e condomínios. Não se prevê uma política de proteção dos trabalhadores prejudicados pelas mudanças nas empresas da energia. Ou seja, há mais financiamento, mas não muda o paradigma ambiental para uma transição energética coletiva; mantém o capitalismo verde.

7. Perpetua o estrangulamento da saúde

O SNS sofre de subfinanciamento crónico, o que leva à crescente dependência dos serviços do setor privado, que o OE financia com cerca de 40% do total destinado à saúde. A degradação das condições de trabalho leva à fuga de profissionais do setor, o que deteriora os serviços prestados à população. O OE2023 mantém esta política, reforçando mais os gastos na área técnica, que nada são sem uma verdadeira mudança na política de carreiras e incentivos dos trabalhadores na área da saúde, para que trabalho com dignidade signifique saúde pública de qualidade.

8. Reduz o financiamento na educação

Na educação, há uma redução de 7,6% nos gastos e, acima de tudo, não há mudanças no campo de maior gravidade: a falta de professores. O fim da precariedade que leva os professores a correrem todo o país, o fim de uma avaliação injusta que congela e  bloqueia a evolução na carreira, a revogação das alterações à mobilidade por doença e o regresso dos estágios pagos para a profissionalização docente seriam medidas centrais que o OE recusa porque não está disposto a gastar mais com a educação de qualidade, que implica valorizar os seus profissionais.

9. Usa os nossos impostos para pagar os lucros dos patrões

Por cada migalha que dá aos trabalhadores, Costa prevê uma compensação às grandes empresas, que descontarão menos 1% para o Fundo de Compensações do Trabalho ou verão reduzidos em 50% o valor a pagar em sede de IRC se diminuírem as diferenças salariais dentro da empresa. O governo irá gastar 45 milhões de euros para compensar os senhorios pela definição de um teto de 2% ao aumento das rendas. No setor energético, o OE destina três mil milhões de euros para proteger as empresas dos aumentos de preços da energia previstos para 2023. São os nossos impostos que vão, portanto, financiar os lucros dos patrões.

10. Prioriza os compromissos com a UE, sem ter um projeto de país que sirva os trabalhadores e a juventude

Mais de metade do OE2023 vai para a Gestão da Dívida Pública. Só aqui fica clara a prioridade deste Governo. No mesmo sentido, o Governo continua a recusar uma política de salários e carreiras dignos e de contratação a sério que garantissem Saúde, Educação, Transportes e tantos outros serviços com qualidade, porque as regas do défice da UE não permitem. Sem suspender o pagamento da dívida e romper com as regras do défice e do euro/EU, não é possível tomar as medidas necessárias que sirvam os trabalhadores. Para garantir os mínimos é cada vez mais preciso exigir os máximos.

Flor Neves