A NOSSA CLASSE AVIAÇÃO EDITORIAL

Governo impõe retrocesso histórico na TAP e sindicatos assinam sem democracia e luta

No passado dia 8 de fevereiro, o Ministério das Infraestruturas e Habitação (MIH), que trata do dossier TAP, lançou uma nota para a comunicação social em que dava conta dos acordos de emergência alcançados na Companhia com os sindicatos. Foram 6 acordos de empresa com 15 sindicatos. Não se cansa o dito MIH na referida nota de se congratular com as assinaturas, realçando o “sentido de responsabilidade e de compromisso” e a “compreensão demonstrada” pelos sindicatos. Na mesma nota, o MIH reconhece a dureza do ataque, confirmando assim a derrota dos trabalhadores.

Este acordo prevê um corte nos salários dos trabalhadores a partir dos 1.330 euros, prevê ataques aos horários de trabalho e dias de férias, reduz milhares de postos de trabalho – aumentando o desemprego no país – e marca a lógica de recuperação da TAP à custa dos direitos dos trabalhadores. Relembramos que, antes da pandemia, a TAP já estava em apuros por responsabilidade do acionista privado. Quais os sacrifícios impostos a Fernando Pinto, David Neelman e Humberto Pedrosa ou Antonolaldo Neves? Estes gestores têm de ser chamados à responsabilidade, imputando-lhes culpa pela gestão da TAP. Ao contrário disso foi mais uma vez construída a ideia de que a culpa seria dos trabalhadores e dos seus altos salários. Recordamos que, na TAP, os gastos com os salários pesam 20%, ou seja, tanto como o que a companhia gasta em combustível, mas o capitalismo prefere atacar quem gosta de explorar.

Muitos sindicatos dizem que com esta negociação “não viraram a cara à luta e foram ao combate”. Contudo, deixaram a luta somente para as reuniões de gabinete com Governo e patrões, desfavoráveis logo à partida e com derrota anunciada. Os sindicatos afirmam que foi o acordo possível e “menos mau”. Mas a verdade é que se recusaram a mobilizar os trabalhadores. Assim, foram negociar abdicando da única arma dos trabalhadores e o único factor que pode desequilibrar a balança a seu favor. Terem conseguido alguma coisa só nos deve fazer pensar como teria sido se tivessem de facto lutado através da mobilização dos trabalhadores; pior não seria, com certeza. Além disso, o acordo tem a duração de 4 anos e prevê um pacto de “paz social”na empresa, cortando as possibilidades de reivindicação e autodefesa dos trabalhadores durante todo o período. Finalmente, o sindicatos assinaram estes acordos, na maior parte dos casos sem consultar os trabalhadores, e os que consultaram fizeram-nos à posteriori, perante o facto consumado, encostando-os à parede. Na forma e no conteúdo, os sindicatos demonstraram que estão mais próximos dos patrões e do Governo do que dos trabalhadores que dizem representar.

O acordo alcançado inflige sobre os trabalhadores da TAP um retrocesso enorme, diríamos até histórico. Os despedimentos que resultarão deste acordo, mesmo com as cláusulas “voluntárias” para reduzir o número de trabalhadores e horas trabalhadas, serão de uma magnitude não alcançada em Portugal já há muitos anos. Numa das maiores empresas do país, central para a economia, a TAP vai ser a referência pelas piores razões para Governo e patrões aplicarem a mesma receita para “recuperarem” e atravessarem a crise que toda a gente sabe que aí vem, aplicando austeridade e despedimentos a todos os trabalhadores, no grupo TAP e noutros setores da economia.

Em nome de, supostamente, “defender a TAP pública”, o Governo cumpriu os ditames da UE e protegeu os interesses privados na TAP, contra a única saída possível: uma TAP 100% pública, controlada pelos trabalhadores, para um serviço aéreo ao serviço da população, e não dos lucros privados. Os sindicatos, ao assinarem este acordo sem qualquer resistência, tomaram o lado da desmobilização e entraram na chantagem escrita e falada do Apocalipse, fizeram a sua parte do lado do Governo e da Administração da Companhia. O pronúncio para a resistência da classe trabalhadora para o que aí vem não é bom. Ela necessita de ganhar consciência de que só renovando as suas direções e organizações será possível uma perspetiva diferente. Estamos apenas no começo de grandes ataques contra a nossa classe. Serão precisas novas ferramentas e uma força redobrada para que a TAP seja a excepção e não a regra.