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A pobreza no país e as esmolas de Costa

Sem política para erradicar a pobreza, o governo de António Costa limita-se a medidas pontuais e inócuas, quando não reduz à má fila o valor de salários e pensões. Ao mesmo tempo, salvaguarda os superlucros da banca e de grandes empresas como Galp, EDP, Sonae ou Jerónimo Martins, ou concede bónus milionários aos seus colaboradores, conforme demonstrado no recente escândalo TAP/Alexandra Reis.

O Natal de 2022 foi mais pobre em Portugal. Para os trabalhadores, é claro. Enquanto a inflação se mantém entre 9% e 10% desde junho passado, os salários nominais não crescem mais de 4%. Por conta disso, calcula-se que a perda do seu poder de compra foi de 5% em média no ano que passou. Não espanta, portanto, que aumente o número de trabalhadores pobres no país, mesmo que não estejam em situação de desemprego. O cenário para 2023 não se prevê muito diferente. Decreto-lei promulgado pelo governo estabeleceu para a Função Pública um aumento salarial com valor fixo de 52 euros em janeiro para quem ganha até 2.600 euros e de apenas 2% para quem ganha acima desse valor. No setor privado, o acordo de rendimentos assinado por sindicatos e patronal prevê um reajuste de somente 5,1%.

Quanto aos pensionistas, perderam poder de compra em 2022 e serão ainda mais prejudicados a partir de 2023, por conta da verdadeira armadilha arquitetada pelo governo PS para emagrecer drasticamente as suas pensões. Em troca de um acréscimo equivalente ao valor de meia pensão pago apenas uma vez, em outubro de 2022, o governo suspendeu a lei de atualização das pensões de acordo com a inflação. Isso significa que em vez de serem aumentadas em 8,42% agora em janeiro de 2023, percentagem correspondente à estimativa da inflação feita pelo governo, as pensões terão um reajuste bastante inferior, entre 3,89% a 4,83%.

Conforme cálculo do jornal Público: o pensionista que ganha 600 euros mensais terá um acréscimo no valor de sua pensão de apenas 28,98 euros, em vez dos 50,52 euros a que teria direito caso fosse aplicada a lei. O pior é que a base de cálculo para os aumentos dos anos seguintes será esse valor rebaixado. Criticado pelas associações de pensionistas, o governo nega cinicamente o evidente corte nas pensões.

Triste 8.º lugar

Conforme cálculo da Defesa do Consumidor (DECO), um cabaz de bens alimentares essenciais, que custava em fevereiro do ano findo cerca de 185 euros, aumentou para 218 euros em dezembro. Isso significa que a inflação está a penalizar principalmente os mais pobres. Para eles a inflação significa não ter comida na mesa.

Por outro lado, as rendas altas e a subida da taxa de juros têm transformado a habitação num item cada vez mais proibitivo para uma grande parcela da população. Hoje há mais de 49 mil famílias na Grande Lisboa a viver em condições consideradas indignas, enquanto no país 9 mil pessoas estão em situação de sem-abrigo.

Não é por acaso que Portugal passou a ocupar o 8º lugar na lista dos países europeus com maior risco de pobreza e exclusão social. Nessa situação, segundo o Eurostat, o Gabinete de Estatísticas da União Europeia, encontram-se 2,3 milhões de portugueses, o equivalente a 22,4% da população. Considera-se estar em risco de pobreza os que vivem com menos de 554 euros líquidos por mês, o que torna praticamente impossível garantir uma refeição de carne ou peixe com regularidade ou manter a casa aquecida.

Pobreza tem rosto

A maioria dos pobres ou em risco de pobreza em Portugal são mulheres, velhos e imigrantes, mais especificamente aqueles denominados pelo jargão dos burocratas europeus como estrangeiros extracomunitários. São marroquinos, timorenses, nepaleses, indianos, paquistaneses, senegaleses, guineenses e de vários outros países da África subsariana. Muitos dos que vêm para Portugal com a esperança de melhorar de vida, só encontram exploração e fome.

É o caso dos imigrantes que trabalham na campanha da azeitona no Alentejo. Quando não há mais trabalho, ficam sem qualquer proteção, a dormir no relento e sem dinheiro sequer para comer, a depender totalmente da caridade de instituições não-governamentais, como a Cáritas e outras. Enquanto os partidos de extrema-direita, racistas e xenófobos, como o Chega, os acusam de serem uns malandros que se aproveitam dos subsídios do Estado, a realidade é bem diferente. O Observatório das Migrações apurou que os imigrantes em Portugal contribuem muito mais do que recebem dos cofres do Estado. Em 2021, o saldo entre contribuições efetuadas e prestações sociais recebidas atingiu os 968 milhões de euros.

As esmolas de Costa

Em vez de aumentar salários e pensões de acordo com a inflação, acabar com a precariedade e a exploração dos imigrantes, tornando legais todos os que vivem e trabalham no país; em vez de congelar o valor dos aluguéis e aumentar a oferta de imóveis a preços adequados à realidade portuguesa, o governo entretém-se a dar esmolas que só perpetuam a situação de penúria.

Exemplo disso são os 70 euros, em complemento ao abono de família, dados a cada criança em situação de pobreza extrema, num total de 150 mil, ou o apoio extraordinário de 125 euros concedido, apenas uma vez, aos trabalhadores e beneficiários de prestações sociais, e o mais recente cheque de 240€ aos mais pobres, para supostamente minimizar o impacto da subida dos preços.

A inflação em 2022 totalizou 8,1%, mas o salário mínimo foi reajustado em apenas 7,8%. O seu valor subiu de 705 para 760 euros. É com esse dinheiro que 25% dos assalariados em Portugal terão de sobreviver e pagar as suas despesas com alimentação, moradia, transporte e vestuário. É com esse magro rendimento que terão de enfrentar um ano em que, segundo as previsões do próprio Banco de Portugal, o crescimento económico baixará de 6,8% para 1,5%, em que a recessão é uma perspetiva realista e a inflação vai continuar.

Ao mesmo tempo em que se recusa a aumentar os salários da função pública e o salário mínimo de acordo com a inflação, ou a congelar os preços dos aluguéis e dos bens de primeira necessidade, o governo do PS recusa-se ainda a tributar os lucros extraordinários das empresas. Até agora, aceitou taxar apenas a parcela dos lucros das empresas petrolíferas e de distribuição alimentar que ultrapasse os 20%. Deixa de fora, desta forma, a maior parte desses lucros e as empresas do setor elétrico, a banca e as seguradoras.

Para quem governa o PS?

A verdade é que o governo de Costa atende aos interesses do grande capital e dos seus auxiliares, no governo e fora dele. A sua obsessão em reduzir a dívida pública, na mesma linha do tempo da troika, e manter as contas certas, isto é, obedecer ao receituário da Comissão Europeia, não inclui as benesses concedidas aos seus colaboradores, como os 500 mil euros dados a Alexandra Reis, ou os lucros das grandes empresas.

Quem está a pagar a conta da crise são os de sempre, os trabalhadores. Alterar isso só pode ser uma tarefa dos próprios trabalhadores – na luta, e não em negociações e geringonças nas quais sempre saem a perder.